Hino 1 – Lua Branca

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Última atualização em 8 de outubro de 2024.

INTRODUÇÃO

A LUA CHEIA NA ÚLTIMA CEIA E A PROMESSA DO NOVO FRUTO DA VIDEIRA

“A festa da Páscoa é aquela que recorda a libertação do Egito. Trata-se de uma festa marcada pelo calendário lunar, que começa ao cair da tarde do primeiro dia de lua cheia da primavera” (MALZONI, 2010:91). Pessach, Jerusalém, Judeia, 30 d.C., quinta-feira, o Mestre da Galileia dos estrangeiros (gentios) faz uma promessa segundo o Evangelho atribuído a Marcos, tradução Bíblia de Jerusalém (2002): “Enquanto comiam, ele tomou um pão, abençoou, partiu e lhes deu, dizendo: “Tomai, isto é meu corpo”. Depois, tomou um cálice, rendeu graças, deu a eles, e todos dele beberam. E disse-lhes: “Isto é o meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado em favor de muitos. Em verdade vos digo, já não beberei do fruto da videira até aquele dia em que beberei o vinho novo no Reino de Deus” (Mc 14:22-25). Vamos relembrar a origem do ritual.

 

A MEMÓRIA DA ÚLTIMA CEIA: A PÁSCOA JUDAICA.

Não foi uma ceia comum. Marcos é qualificado como o “Evangelho das epifanias secretas” (WELBURN, 1991: 19). A boa-nova marcana codifica uma profunda mensagem esotérica na festa da “passagem” ou da “transição” (Pessach), remontando à instituição da primeira ceia pascoal, registrada em Êxodo 12 e que assim se inicia: “Disse Iahweh a Moisés e Aarão na terra do Egito…” (12:1). A ceia era uma preparação para a saída do Egito (a esfera da prisão), pois a instrução de Iahweh no versículo 11 diz: “É assim que devereis comê-la: com os rins cingidos, sandálias nos pés e vara na mão…”. Os comentaristas da Bíblia de Jerusalém traduzem: “É a roupa de viagem(BÍBLIA, 2002: 117. Nota “f”).  A viagem rumo a terra de Canaã (libertação). Porém, observem: além dos rins cingidos, literalmente colocar ao redor da cintura o cordão que amarra a túnica (estar pronto para partir), a mensagem fala em calçar sandálias e empunhar a vara. As sandálias e o caduceu de Mercúrio, Hermes e Thot, mensageiro dos deuses – “Assim foi Moisés iniciado em toda a sabedoria dos egípcios e tornou-se poderoso em palavras e obras” (At 7:22). A “viagem dos hebreus” iniciada pela ceia – que é a memória que fundamenta a última ceia de Jesus – é mística; não foi escrita para ser entendida literalmente. O professor judeu Yosef H. Yerushalmi, que escreveu sobre tradição judaica e lecionou na cátedra de História, Cultura e Sociedade Judaica na Universidade de Colúmbia, traz luz a esse entendimento: “Que a historiografia bíblica não é “factual” no sentido moderno é algo bastante evidente, dispensando comentário mais detalhado”; e acrescenta: “As narrativas históricas que abrangem os períodos dos inícios da humanidade até a conquista de Canaã são necessariamente mais lendárias…” (YERUSHALMI, 1992: 33). Há uma alma a ser desnudada despindo-se o véu da Palavra. Chamo a atenção para o âmago da promessa marcana de Jesus na última ceia: “Em verdade vos digo, já não beberei do fruto da videira até aquele dia em que beberei o vinho novo no Reino de Deus” (Mc 14:22-25). Vamos à linguagem cabalística das três expressões chaves proferidas pelo Mestre:  fruto da videira, aquele dia e Reino de Deus.

 

AS EXPRESSÕES DE JESUS NA PROMESSA DA ÚLTIMA CEIA

PRIMEIRA: FRUTO DA VIDEIRA

Na Bíblia, a videira ou vinha remete à tribo de Judá (Isaías 5:7), e também à mulher: “Tua esposa será videira fecunda no interior de tua casa…” (Sl  128:3). A videira é uma liana (um cipó), que na simbologia de Jesus refere-se à Vida manifestada no Eu Sou: “Eu sou a verdadeira videira e meu Pai é o agricultor” (Jo 15: 1). O que um agricultor pode fazer sem a Mãe Terra? O Pai fecunda, e a Mãe gera. O Filho está no Pai e na Mãe:  “Eu Sou… a Videira verdadeira” – saber e compreensão (frutificação). Nas bodas de Caná (Jo 2: 4), quando a Mãe interpela o Filho sobre a falta de vinho, Ele responde segundo a tradução da Bíblia de Jerusalém (2002): “Mulher, o que há entre mim e ti?” – compartilhamento: “Tua esposa será videira frutuosa, no coração de tua casa; teus filhos, rebentos de oliveira, ao redor de tua mesa” (Salmos 128: 2-3). O Filho é rebento da “Esposa”. Mestre Irineu combina os dois sentidos bíblicos para “videira” no hino 31, 1: “Papai Samuel me chama/Para dizer o que queria/Para eu viver eternamente/Junto a Virgem Maria”. Papai Samuel é o patrono da Casa de David (Judá), daí “Papai”, o profeta que unge o futuro rei. A unção faz o Espírito do Senhor apoderar-se do ungido (1 Samuel 16: 13), e desde Nazaré a Mãe é declarada portadora do Espírito (Lc 1: 35).  Agora, subscreve o Evangelho Eterno de Apocalipse 14, 6 através de Juramidã: “Para eu viver eternamente junto a Virgem Maria”. A propósito, se não me equivoquei, as palavras “eterno (a)”, “eternidade” e “eternamente” são grafadas em 25 hinos sendo repetidas 43 vezes. A palavra “sempre” é grafada em 34 hinos sendo repetida 68 vezes, incluindo a expressão “para sempre”, que aparece em 11 hinos com 29 repetições. Somando, temos o impressionante número de 111 citações de palavras que enfatizam a eternidade.

 

SEGUNDA: AQUELE DIA

Sobre os mistérios do “fim dos tempos”, a escatologia, Jesus alertou: “Guardai-vos, pois, de não carregardes os vossos corações com demasias de comer e beber e com os cuidados terrenos, para que aquele dia não vos colha de improviso” (Lc 21, 34). De qual “dia” Jesus está a falar? Do temível e mitológico dia do juízo final da apocalíptica vulgar? A principio, Jesus se vale de uma tradição profética hebraica que utiliza a expressão “naquele dia” para anunciar a presença do “tempo messiânico” (vide Amós 9:11; Oséias 2:23 e Isaias 4:2, por exemplos). Esse “dia” anunciado pelos profetas veterotestamentários cumpriu-se com a presença de Jesus na terra. Por isso, Paulo diz em 2 Cor 6, 2: “Eis agora o tempo favorável por excelência. Eis agora o dia da salvação”.  Em segundo, Jesus usa uma linguagem cabalística: no Evangelho atribuído a João, por duas vezes a palavra “dia” aparece como sinônima de “luz”, que por sua vez é correlacionada ao próprio Jesus: “Temos de levar a efeito as obras de quem me enviou, enquanto é dia. Vem a noite, quando ninguém mais pode trabalhar. Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo” (Jo 9: 4,5). O livro do Gênesis, em seu primeiro capítulo, afirma de forma inequívoca que a palavra “dia” no simbolismo bíblico significa luz: “Deus disse: “Haja luz”, e houve luz. Deus viu que a luz era boa, e Deus separou a luz e as trevas. Deus chamou à luz “dia” e as trevas “noite”” (Gn 1:3-5). Usando essa chave, o código de Jesus “(…) Para que aquele (a) dia (luz) não vos colha de improviso” (Lc 21: 34) é descodificado por Juramidã no título e no mistério do hino 30, “Devo Amar Aquela luz”, presente no corpo do hinário, mas que protagoniza o arcano prefaciador d’ O Cruzeiro junto ao hino 29, primícias de uma grande revelação.  Vamos à última expressão.

 

TERCEIRA: REINO DE DEUS

Antes de tudo é crucial entender o contexto linguístico em que Jesus falava. Recorro ao ex-padre e eminente teólogo Geza Vermes (1924-2013), especialista em biografia de Jesus: “Era em aramaico que Jesus pensava e argumentava com seus amigos e antagonistas. A forma linguística autêntica do seu ensinamento, com exceção de cerca de uma dúzia de palavras preservadas nos Evangelhos, desapareceu rapidamente. (…) O conjunto da mensagem transmitida pelos apóstolos – o Evangelho, as epístolas e o resto – foi registrado em grego, o que constitui a forma mais antiga que possuímos do Novo Testamento. Porém, esse Novo Testamento grego é uma “tradução” dos pensamentos e ideias genuínos do pensar e falar aramaicos de Jesus e seus discípulos imediatos, não apenas a tradução de uma língua inteiramente diferente, mas também o transplante da ideologia dos Evangelhos para o ambiente cultural e religioso completamente estrangeiro do mundo pagão greco-romano” (VERMES, 2006: 11).

“Reino” em aramaico é Malchut (pronuncia-se malrrut), a décima esfera da Árvore da Vida cabalística, que corresponde à Terra onde habita A “Presença (Força) da Rainha”, conhecida por Shekinah (GONZÁLEZ-WIPPLER, 2006: 63-64). Em Mt 25, 31-46, quando justamente está discursando sobre a vinda do Filho do Homem, Jesus fala parabolicamente: “(…) Vinde benditos de meu Pai, herdai o reino preparado para vós desde a fundação do mundo.” (Mt 25: 34). Na síntese do ex-jesuíta, teólogo e jornalista Jack Miles: “Que reino foi preparado para a humanidade na fundação do mundo? O que mais, exceto a própria Terra…” (MILES, 2002: 238). Ademais, Jesus, quando objetiva traduzir o que é “O Reino”, falando aos seus discípulos camponeses que tiravam da Mãe Terra o sustento, usa parábolas agrícolas para ser melhor compreendido, como a famosa Parábola do Joio e do Trigo: “O Reino dos Céus é semelhante ao homem que semeou boa semente em seu campo…” (Mt 13: 24-30) Em seguida, profere a não menos célebre Parábola do Grão de Mostarda: “O Reino dos Céus é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo…” (Mt 13: 31-32). Inspirado, o mitólogo Joseph Campbell afirma: “Eis o que a Deusa é, o campo que produz formas” (CAMPBELL, 1990: 179). “A Deusa é a figura mítica dominante no mundo agrário da antiga Mesopotâmia, do Egito e dos primitivos sistemas de cultura de plantio” (p. 177). Conseguinte, em linguagem judaica-cabalística e não mítica, ao prometer na última ceia que “naquele dia” beberia de um certo “vinho novo”, “fruto da videira” (o “Vinho da Deusa”) no “Reino do meu Pai”, Jesus afiançava sua reencarnação na Terra para consagrar o “Vena” com seus discípulos!

 

VENA (SOMA), RIG VEDA, ÚLTIMA CEIA, O DAIME E UMA LITURGIA EM COMUM

O enólogo Jean-François Gautier esclarece que a pré-história do vinho remonta a vários milênios antes do início da era cristã, com o Soma, “bebida sacrificial fermentada da Índia védica” e expansora da consciência. O que poucos sabem é que o Soma também se chamava “Vena” (amado, em sânscrito) de onde se originou o nome vinho em português, vino em russo, wein em alemão, vino em espanhol, wine em inglês, vin em francês e woinos, depois oinos em grego (GAUTIER, 2009:13). Citei o grego por último, pois além de ser a língua original dos Evangelhos, é derivada do sânscrito. O autor do Evangelho de Marcos não foi testemunha ocular e escreve por volta do ano 70 d.C., 40 anos após a morte de Jesus (BROWN, 2012: 206). O Mestre, falando em aramaico, pode não ter dito exatamente vinho, mas Vena! Conhecimento que pode ter sido adquirido em sua jornada de estudos na Índia, conhecida e polêmica teoria que foi confirmada por Mestre Irineu, quando um senhor ao visitá-lo indagou-o a respeito baseado em um livro que havia lido. Daniel Serra, o ilustre sobrinho, testemunhou o colóquio e transmitiu-me a informação há cerca de vinte anos.

Temos mais uma pista: a doutrina de Jesus é inegavelmente influenciada por Buda: “Ambos proíbem matar, roubar, mentir, ter relações sexuais ilícitas. Ambos mandam respeitar os mais velhos. Ambos louvam a paz interior. Ambos querem pagar o mal com o bem, e recomendam amar os inimigos, não acumular riquezas supérfluas, e optar pela misericórdia em vez do sacrifício”  (KERSTEN, 1986:86-87). Havia uma conexão entre a Índia e Jerusalém, principalmente durante as tradicionalíssimas festas da Páscoa, Tabernáculos e Pentecoste, em que “(…) Milhares de milhares de peregrinos acorriam à cidade antiga, vindos de todas as partes do Império Romano e de mais longe, de locais como a Pártia e até a Índia(JACOBOVIC, 2015: 319). Complementa o professor Andrew Welburn: “Alexandre havia pavimentado o caminho. Os mercadores sírios – os grandes mediadores da Antiguidade – estabeleceram rotas comerciais para a Índia através de terrenos difíceis” (WELBURN, 1991:130).

Entremos em um longo túnel do tempo e o clarão no fim da travessia é a gloriosa nação cognominada Luz da Ásia, berço de grandes luminares da espiritualidade. Veda em sânscrito significa “conhecimento”, a sagrada escritura mais antiga da Índia, dividindo-se em quatro ramos. O mais antigo é o Rig Veda que, supõe-se, data do terceiro ou quarto milênio a.C. (KALYAMA, 2003: 55). É composto por 1028 hinos divididos em dez “domínios” que recebem o nome de mandalas. A mandala de número 9 (Esfera da Lua na Cabalá) contém 114 hinos exclusivamente dedicados ao Soma (Vena), que segundo o saudoso psiconauta Terence Mckenna é um “deus lunar” (MCKENNA, 1995: 156). Os 114 (6) hinos do Soma, os 114 (6) ditos do “quinto Evangelho”, o de Tomé (martirizado na Índia), e as 132 (6) flores que compõem O Cruzeiro aportam no número que finaliza a criação (Gn 1:31), traduzindo a totalidade doutrinária.

Os “videntes” do Rig Veda se autodenominavam “Filhos da Luz”, mesmo epíteto dos essênios (FLUSSER, 2000: 174. Vol. 1). Esses profetas “(…) Redigiram os hinos védicos em estado alterado de consciência. Eles bebiam uma substância enteógena chamada Soma, que produzia a alteração da consciência” (KALYAMA, 2003:54). O autor detalha elementos da liturgia do culto desses “videntes-poetas”: “(…) A repetição contínua [dos hinos], aliada ao ato de beber o Soma, levava ao transe, o que fazia dos hinos um veículo para o sagrado. É dos antigos hinos védicos que surgiu a ciência dos sons sagrados” (pp. 105-106).

O que se cumpre na liturgia do tradicional bailado do Daime? Toma-se o “novo Soma”, o “novo Vinho” e, em seguida, cantam-se os hinos da coleção de hinários que compõem as escrituras daimistas. Aproximadamente a cada trinta hinos repete-se o Daime e, em transe (consciência expandida), as palavras dos hinos ornadas pelo condão musical ganham vida. O que é digno de atenção em relação à promessa da última ceia é constatarmos, segundo Marcos, que Jesus após servir o “Vena” também cantou hino: “Em verdade vos digo, já não beberei do fruto da videira até aquele dia em que beberei o vinho novo no Reino de Deus. Depois te terem cantado o hino, saíram para o Monte das Oliveiras” (14: 23-26). Tomar “vinho” e cantar hino… Sob os auspícios da mesma lua cheia da última ceia, Juramidã inaugura o Novíssimo Testamento com o hino Lua Branca, replantando e ressignificando a doutrina de Jesus.

Entre os judeus, revestida de grande importância era a lua nova do chamado sétimo mês, conhecida por Tisri (Tishrei), o mês das festas judaicas de Rosh Hashaná (Ano Novo judaico); Yom Kipur (Dia do Perdão judaico) e Sucút (Festa dos Tabernáculos).  É o que assinala o livro de Levítico 23: 24,25: “Diga também aos israelitas: No primeiro dia do sétimo mês vocês terão um dia de descanso, uma reunião sagrada, celebrada com toques de trombeta. Não realizem trabalho algum, mas apresentem ao Senhor uma oferta preparada no fogo”. A mesma lua nova dos judeus renasce em sua importância quando, segundo Mestre Irineu é permitido – de preferência no terceiro dia – retirar o cipó e a folha da floresta para a preparação do Daime. É um ritual de consagração e oferta que se faz a toda divindade, sendo exigido o mesmo resguardo sexual dos judeus para as festas da lua nova (I Samuel 20: 5, 24-26). Nas matas sombrias em uma noite enluarada, da Dama enamorado, um jovem matuto encontra o fio da meada dando início às “Bodas do Cordeiro” (Ap 19:7)…

 

DEUS TE SALVE Ó LUA BRANCA

DA LUZ TÃO PRATEADA

TU SOIS MINHA PROTETORA

DE DEUS TU SOIS ESTIMADA

 

A MULHER VESTIDA DE SOL, A ARCA DA ALIANÇA  APOCALÍPTICA

A lua branca e a divina Mãe são expressões de uma só verdade. Iluminado e amparado pela luz ditosa em plena noite escura, a reverência expressa o júbilo de encontrar, pelo Sol aclarada, a Deusa prateada, a Arca da aliança apocalíptica. Em Ap 12, 1 João vê que “Um sinal grandioso apareceu no céu” na forma de “uma Mulher vestida com o Sol”. Imediatamente antes dessa visão, João testemunha que “O templo de Deus que está no céu se abriu, e apareceu no templo a arca da aliança. Houve relâmpagos, vozes, trovões, terremotos e uma grande tempestade de granizo” (Ap 11: 19). Então aparece a Mulher…

Na Bíblia, a arca simboliza salvação e ao mesmo tempo “cofre”, onde se guarda valores: “O ouro (sabedoria) que tem na terra (Mãe) é a luz que brilha mais” (O Cruzeiro, 60: 3).  Nos dias de Noé, Gênesis 6: 5 relata que, “(…) A maldade do homem era grande sobre a terra…”, “Mas Noé encontrou graça aos olhos de Deus” (Gn 6: 8), e assim, “(…) Estabelecerei minha aliança contigo e entrarás na arca…” (Gn 6: 18), que “(…) Ficou elevada acima da terra” (Gn 7: 17). Vejamos o paralelismo: nos dias de Jesus, a maldade do homem era igualmente grande, e um anjo de Deus disse: “Não temas, Maria! Encontraste graça junto a Deus. Eis que conceberás no teu seio e darás à luz um filho, e o chamarás com o nome de Jesus”. (Lc 1: 30-31). Deus grafa em Maria o prólogo da Nova Aliança. Assim como a Arca de Noé esteve elevada acima da terra, diz Maria tomada do Espírito Santo: “Doravante as gerações todas me chamarão de bem-aventurada…” (Lc 1: 48).

E se a Arca da Aliança mosaica guardava o tesouro da Lei, Maria era a “(…) Depositária da Palavra de Deus encarnada, que nos veio ensinar, com perfeição, a vontade do Senhor, ou seja, a Lei em pessoa…” (FARIA, 2013: 15-16). Nesta era de uma novíssima aliança, iluminando tempos sombrios, a Virgem Mãe, a “Lua Branca”, a soberana Arca do mistério salvífico que inspira este evangelho visionário de Juramidã, vem dar cumprimento à promessa genesíaca: “Ela te esmagará a cabeça…” (Gn 3: 15). A cabeça pensante sede ao noûs mirante…

 

Ô MÃE DIVINA DO CORAÇÃO

LÁ NAS ALTURAS ONDE ESTÁS

MINHA MÃE LÁ NO CÉU

DAI-ME O PERDÃO

 

O primeiro pedido de Irineu à Mãe divina fundamenta a lição primaz deste sagrado evangelho: a humildade. Humildar-se: tornar-se humus na terra do perdão e modelar o novo Adão.

 

DAS FLORES DO MEU PAIS

TU SOIS A MAIS DELICADA

DE TODO O MEU CORAÇÃO

TU SOIS DE DEUS ESTIMADA

 

VERSOS 1 E 2: “DAS FLORES DO MEU PAIS/TU SOIS A MAIS DELICADA”

De qual “país” o versículo está a falar? Aquele jovem indouto que canta “tu sois” tinha plena consciência de toda sabedoria contida no verbo que se manifestava? Ele levaria aproximadamente quinze anos para apresentar o hino que abre sua boa-nova redentora. O fez após seu primeiro discípulo, o “maninho” Germano Guilherme anunciar-lhe o hino Divino Pai Eterno, da lindíssima boa-nova Vós Sois Baliza, que oficialmente abre o bailado festivo de Santos Reis, São João, Virgem da Conceição e Natal. Vamos às elucubrações dos mistérios que o “país” decantado possa conter.

 

A PÁTRIA ESPIRITUAL

Segundo as pistas deixadas nos próprios hinários que compõem a base doutrinária do Daime e que, portanto, servem de referências plausíveis à opção “pátria espiritual”, cito dois hinos: o primeiro é De Longe, em que o Mestre revela vir  “das ondas do mar sagrado” (O Cruzeiro, 110:1). Uma das opções exegéticas é enxergar o mundo genesíaco onde, na tradução da Bíblia de Jerusalém, 2002, “(…) Um sopro de Deus [Espírito] agitava a superfície das águas” (Gn 1:2). Antes, o hino O Divino Pai Eterno remonta à origem edênica: “O divino Pai eterno/Quem me fez quem me criou/Para eu ser um filho seu/No jardim de belas flores” (59:1), pois “Deus tomou o homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar” (Gn 2:15). O segundo é Vamos Dar Viva A Nossa Pátria, do hinário de Maria Damião, O Mensageiro. O hino assim se inicia: “Vamos dar viva a nossa pátria/Com amor e com coragem/Com o poder do Soberano/A nossa Mãe vai nos guiando” (48:1). Reitero o que revelei ao final do post “Apresentação”: segundo Percília Matos, tutora do hinário, a “pátria” não se refere ao Brasil e sim à Pátria Espiritual, o que está de acordo com o versículo 5 do mesmo hino: “O nosso Mestre nos dá força/Até um dia final/Que a nossa mãe está nos esperando/No reino divinal”. O que pode, de alguma forma, estar em concordância com o hino Lua Branca, pois C. G. Jung em seu legado mitológico afirma que, “Na crença antiga a Lua é um lugar de reunião das almas que partiram deste mundo” (JUNG, 2011: 375).

 

A PÁTRIA BRASIL

Mas se quisermos considerar o “país” como se Mestre Irineu estivesse a falar do Brasil, estou particularmente convencido de que esse abençoado torrão, onde segundo o Hino Nacional, “a imagem do Cruzeiro resplandece” e os “seus lindos campos tem mais flores” é a Pátria do Graal,  do “sonho intenso, um raio vívido” em que a portadora do sagrado vaso e dominadora do mistério é a Dama divina, que “de amor e de esperança à terra desce”, dentre as flores a mais delicada,  “Mãe gentil” dos “filhos desse solo” espelhada na fertilidade singular da “terra adorada”!

 

A PÁTRIA DO GRAAL

O Brasil era conhecido na lenda do Graal, que vicejou entre os bretões, tribo dos celtas, cuja floresta encantada era conhecida por Briziljan, algo como “Braziljangle”, a floresta do Brasil. O grande romance do Graal, Parsifal, escrito pelo templário Wolfram Von Eschenbach, publicado no início do séc. XIII, cita Briziljan quatro vezes, como uma floresta que o Herói do Graal penetra em sua busca pelo sagrado mistério (ESCHENBACH, 2015: 523). O autor faz menção a uma floresta de pau-brasil (p. 372), lugar onde Galvão, personagem que atua como um sósia de Parsifal, deveria “(…) Colher a coroa de ramos que me restituirá a felicidade perdida” (p. 372). A “coroa” é Kether, a esfera 1 da Cabala, o “Reino da Miração” despertado no chacra coronário, onde o jovem Irineu estava quando viveu a magia do hino primordial.

Sobre a citação do pau-brasil, A. R. Schmidt Patier, tradutor e comentarista da belíssima edição de Parsifal em português, anota: “Não deixa de ser singular a menção ao pau-brasil num poema publicado três séculos antes da descoberta do Brasil. Adelino José da Silva d’Azevedo em Este nome: Brazil, comentado pela Enciclopédia Mirador Internacional no verbete ‘Brasil’, dá a seguinte explicação a respeito: – O pau-brasil teria sido extraído desde o século VI a. C. por fenícios e gregos, de uma certa ilha chamada Brasil situada no Atlântico, sendo vendido aos celtas da Irlanda. (…) Não deve ser esquecido que, segundo a lenda, o corpo do rei Arthur teria sido transportado e exumado na ‘Ilha Afortunada…” (SCHMIDT PATIER, 2015: 517). O biólogo, navegador e premiado escritor Yuri Sanada complementa: “Esta ilha figura nas lendas fenícias de 3000 anos atrás com o nome de Braaz. Nas lendas celtas, ela se chama Hy Brazil, e curiosamente tem o mesmo significado, Terra Abençoada. É dito que a palavra inglesa bless, que significa abençoar, deriva da palavra celta bress, de onde, por sua vez, veio o nome da ilha” (SANADA, 1999: 137).

 

A ILHA DE VERA CRUZ (ILHA DA CRUZ VERDADEIRA)

Os mistérios codificados pelo trovador templário em Parsifal eram de amplo conhecimento da irmandade do Graal, que incluíam os cátaros, brutalmente perseguidos e incinerados pela Igreja de Roma.  Quando em 18 de março de 1314, o último grão-mestre da Ordem dos Cavaleiros Templários, Jacques de Molay foi queimado vivo em praça pública em Paris, ironicamente tendo a Catedral de Notre-Dame (Nossa Senhora) ao fundo, remanescentes dos mártires de Madalena-Sophia fugiram para Portugal onde foram acolhidos pelo rei D. Diniz, que decidiu não acatar as ordens de condenação do papa Clemente V (SANADA, 1999: 44, 50). Passaram-se quase duzentos anos, quando um homem de 32 anos, Cavaleiro da Ordem de Cristo, herdeira dos bens dos Templários, foi escolhido para selar nosso destino e aqui chegar intencionalmente. Trata-se do comandante Pedro Álvarez Cabral, que num dia de domingo, 8 de março de 1500, partiu do rio Tejo com uma frota de nove naus, três caravelas e uma naveta de mantimentos para dar sustentação aos 1500 homens da expedição (SANADA, 1999: 101-114). No dia 22 de abril, quarta-feira, a frota finalmente avistou a terra primeiramente chamada de “Ilha de Vera Cruz”, a “ilha afortunada” dos fenícios e celtas. “vera cruz” ou “cruz verdadeira” ou “santa cruz” é a cruz de dois braços (principal símbolo daimista) na qual Jesus foi crucificado e que, segundo a lenda repleta de enfeites sobrenaturais, a imperatriz Helena, mãe do imperador Constantino, descobriu em Jerusalém por volta do ano 325 d. C. O que torna essa história ainda mais especial e mágica é a versão contida no best-seller medieval Legenda Áurea, escrito pelo beato católico Jacopo de Varazze (1229 – 1298), afirmar ter sido Cloel, rei dos bretões, o pai de Helena. (VARAZZE, 2003: 417). Abaixo, um ícone de Santa Helena junto à “vera cruz” (o “cruzeiro” daimista), que inspirou o nome primordial do Brasil.

 

 

Ainda levaria 400 anos para Irineu, o nosso Herói do Graal, reencontrar, finalmente, o Cálice de Arthur e refundar ante a visão da Rainha da Cavalaria, o Império da fé, do amor e da cortesia. Nas palavras da historiadora Lucienne Julien, que em 1950 fundou a Sociedade para a Memória e Estudo dos Cátaros: “Tornado rei do Graal, Percival não tarda a desvencilhar-se da realeza temporal para “cantar uma nova missa”, isto é, para criar a religião do Espírito…”(JULIEN, 1993:138). Irineu prossegue o canto introdutório de sua missiva espiritual recebido através da Ayahuasca, que significa “cipó dos espíritos” (MACRAE, 1992: 28)

 

VERSOS 3 E 4: “DE TODO MEU CORAÇÃO/TU SOIS DE DEUS ESTIMADA”

“De todo meu coração” é não estar mais dividido entre a fé a razão. Somente a pura revelação da Alma reanimada, redescoberta e celebrada: Anima, Deusa, Lua, “Tu sois de Deus estimada”! Fala Sophia em Provérbios 8: 22-31: “Estabeleceu-me o Eterno como início de Seu caminho, a mais antiga de todas as Suas obras. Um trono me foi concedido, ainda no passado distante, antes da criação da terra…E era sempre Seu deleite, regozijando-me sempre perante Ele, em recreação por sua terra já habitável e comprazendo-me como os filhos dos homens” (BÍBLIA, 2006: 686).

 

Ô MÃE DIVINA DO CORAÇÃO

LÁ NAS ALTURAS ONDE ESTÁS

MINHA MÃE LÁ NO CÉU

DAI-ME O PERDÃO

 

Podemos dizer que o Daime é a Doutrina do Coração, pois esta palavra aparece n’ O Cruzeiro em 30 hinos com 39 repetições. E justamente no hino inalgural é grafada mais vezes: cinco. O centro da revelação recebendo a dádiva do perdão, ou como diz o  mitólogo: “Este é o sentido do segundo nascimento, quando você começa a viver a partir do centro do coração” (CAMPBELL, 1990: 185).

 

TU SOIS A FLOR MAIS BELA

AONDE DEUS PÔS A MÃO

TU SOIS MINHA ADVOGADA

Ó VIRGEM DA CONCEIÇÃO

 

VERSOS 1 E 2: “TU SOIS A FLOR MAIS BELA/AONDE DEUS PÔS A MÃO”

Pouco importa se o bardo era iletrado; bem disse Oscar Wilde na cela de uma prisão, emocionado: “Sem dúvida alguma, o lugar de Cristo se acha entre os poetas” (WILDE, 2003: 1400). Sophia deleita o coração do profeta: “Porque a Sabedoria é melhor que as pérolas, e nenhuma joia lhe é comparável” (Pv 8: 11).

 

VERSOS 3 E 4: “TU SOIS MINHA ADVOGADA/Ó VIRGEM DA CONCEIÇÃO”

A PARÁCLITA

O termo “paráclito” aparece em seis versículos do Novo Testamento, somente no Evangelho atribuído a João, para designar o Espírito Santo (Jo 14: 16-17, 26; 15: 26; 16: 7, 13). Nas principais traduções do Novo Testamento, o Paráclito é sinonimizado como “Consolador” e “Espírito da Verdade”. Segundo os comentaristas da Bíblia Tradução Ecumênica, “Tomado do vocabulário jurídico, o termo Paráclito designa aquele que é posto ao lado de um acusado para o ajudar e o defender: o sentido primitivo é, portanto, advogado, auxiliar, defensor. A partir daí começa a repontar, quer o sentido de consolador, quer o de intercessor” (BIBLIA, 2015: 2081, n. “I”).

O doutor em teologia e renomado pregador da Casa Papal, Raniero Cantalamessa, correlaciona o termo ao substantivo consolação (paraclesis) e ao verbo consolar (paraKaleite) (CANTALAMESSA, 2014: 112-113).  Além do Espírito Santo, a teologia moderna instiga a considerar todas as acepções que o termo comporta. O primeiro Paráclito foi o próprio Deus de Israel: “Eu, eu mesmo, sou aquele que te consola; quem te julgas tu para teres medo do homem, que há de morrer… Mas onde está agora a cólera do opressor?” (Isaías 51:12-13). Consolo e proteção de Deus sintonizam-se ao versículo 2 do hino 44: “Meu divino Senhor Deus/É Pai de toda nação/Defendei os vossos filhos/De toda escuridão”.

Depois temos Jesus, que personifica o Paráclito na tradução da Bíblia Ecumênica, 2015: “Meus filhinhos, eu vos escrevo isto para que não pequeis, mas se acontece a alguém pecar, temos um defensor diante do Pai, Jesus Cristo, que é justo” (1 João 2:2). No último e quinto versículo do hino 44, a correspondência: “Consolai ó Mãe Divina/Jesus Cristo redentor/É quem pode nos livrar/Neste mundo pecador”.

Por fim, já que estamos no tempo do Espírito Santo e seu Evangelho codificado por Juramidã, temos a Portadora do Espírito como Paráclita não só no versículo ora estudado, bem como no hino 44, 4: “A Virgem Mãe é soberana/Ela é Rainha do mar/Quando vê nós na aflição/Ela vem nos consolar”. O eminente teólogo corrobora: “Peçamos esta graça a Maria, a quem a piedade cristã honra com os dois títulos que, em conjunto, consubstanciam o significado de Paráclito: “Consoladora dos aflitos” [hino 44] e “Advogada dos pecadores [hino 01]”. Ela, sim, fez-se nossa “Paráclita”!” (CANTALAMESSA, 2014: 128).

 

Ô MÃE DIVINA DO CORAÇÃO

LÁ NAS ALTURAS ONDE ESTÁS

MINHA MÃE LÁ NO CÉU

DAI-ME O PERDÃO

 

ESTUDO SINÓPTICO DA DOUTRINA DO CORAÇÃO NOS HINOS D’O CRUZEIRO

A Doutrina do Coração através de Juramidã ensina: como um cálice das bodas consagrada, deve estar asseado – “Para Ela lá no céu/Alimpar meu coração” (hino 8:1); completamente entregue no caminho – “De todo meu coração/Seguindo nesta estrada/Com a verdade na mão” (15: 1); repleto “De alegria com primor” (20: 5); sem falsidade para não perder o vigor – “Só existe é fingimento/Fraqueza no coração (22:4); porque é o lugar onde a luz deve Ser – “No coração eu devo amar a luz” (30: 1); para a primazia receber – “Dentro do coração/O primor tanta beleza” (31:3); e frutificar conscientemente a eucaristia: “Com amor no coração/Para cantar com meus irmãos” (41:7); pois é o divino elo que nos liga – “Estamos todos reunidos/Com amor no coração” (61:2); repositório dessa verdade – “Quando Ela me entregou/Eu gravei no coração” (65:3); como fez o Mestre após São João, para ambos poderem ministrar nas águas do Jordão a redentora iniciação – “Toda verdade afirmou/Gravou no coração/Ambos foram batizados/No rio de Jordão” (66:3); porquanto deveras batizado, o coração está amansado e, conseguinte, firmado e divinamente filiado – “Firmeza eu peço a Deus/Aplanai meu coração/Eu quero ser um filho seu” (70:1); mormente o de Jesus – “A quem é eu peço firmeza/É o coração de Jesus” (70:4). Uma vez doutrinado é o penhor do desencarnado – “Depois que desencarna/Firmeza no coração” (74:3); chancela desta promessa –“Eu digo é com firmeza/Dentro do meu coração/Que Jesus Cristo está conosco/É quem nos dá as instruções” (87: 3); templo da oração pelo despertar dos exilados – “Todos os santos e todas santas/Rogam a Deus no coração/Para os filhos da Terra/Esquecer a ilusão” (105:3). Propondo ao fim a divina remissão: consagrar, jubilar e testificar – “Confessa a consciência/E alegra teu coração/Que esta é a verdade/Que eu apresento aos meus irmãos” (116: 3). A verdade rediviva do eterno Mestre galileu: “Tomai sobre voz o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e encontrarei descanso para vossas almas, pois meu jugo é suave e meu fardo é leve” (Mt 11: 29-30). Amém!

 

ESTRELA DO UNIVERSO

QUE ME PARECE UM JARDIM

ASSIM COMO SOIS BRILHANTE

QUERO QUE BRILHES A MIM

 

TROBAR CLUS: A POESIA HERMÉTICA DOS TROVADORES PROVENÇAIS

A Lua é mãe da poesia, mas neste evangelho visionário não se trata de uma poesia corriqueira. Estamos testemunhando um replante do trobar clus (“poesia hermética”), que era “(…) Uma terminologia simbólica utilizada por alguns trovadores dos séculos XII e XIII para que sua doutrina não fosse acessível aos não iniciados” (SCHMIDT PATIER, 2015: 26). Mestre Irineu, junto a seu discípulo Raimundo Gomes da Silva e seu Ramalho, hinário canônico do CICLU-Alto Santo, expressa o hermetismo: “Sigo sempre o meu destino/Falando meu idioma/Só não falo português/Porque o povo anda na ronda” (102: 3). Bem antes, no hino 54:5 em colóquio astral com seu discípulo, o Mestre justifica um bom motivo para codificar sua doutrina: “Já fazem meio século/Que eu trabalho dentro da luz/Quase vou assassinado/Como assassinaram Jesus”. O primogênito do patriarca Antônio Gomes responde no versículo seguinte: “Os estudos que vós tem/Que o divino Pai lhe dá/Os mesmos assassinos/Não podem lhe assassinar” (54:6).

Foi o que levou os poetas místicos da belíssima Provença na França, berço do trovadorismo (que traduziu o amor como nós o pensamos atualmente) e do catarismo, a criptografar suas doutrinas em versos, “(…) Para evitar a perseguição da Igreja, e que não foi por acaso que esta escola de poesia morreu na época da Cruzada Albigense [que debutou a Inquisição], quando os cátaros indubitavelmente foram suprimidos e massacrados…” (YOUNG, 1968: 169). A historiadora Margaret Starbird complementa: “É verdade que esses artistas foram interrogados por enviados especiais do Papa e, mais tarde, pela Inquisição, criada com o claro objetivo de identificar hereges em Provença, como de fato ocorreu com os menestréis” (STARBIRD, 2004: 91). O escritor e ambientalista suíço Denis de Rougemont revela em sua obra-prima História do Amor no Ocidente, que “(…) Amor em provençal pertence ao gênero feminino”. E nos comunica ser a “Dama” que encarna esse princípio a “ (…) “Maria-Sofia” das heresias gnósticas (o princípio feminino da divindade)” e a “(…) Anima ou, mais precisamente, a parte espiritual do homem…” (ROUGEMONT, 2003: 122, 125).

Entretanto, para esses trovadores hereges, “Maria-Sofia” não era a mãe de Jesus, e sim Maria Madalena que, “Nos tempos medievais foi chamada a “portadora da luz”, recordando o seu epíteto gnóstico de “herdeira da luz” em sua busca pela verdade. Ela é a mediadora do mistério divino [no simbolismo de Jo 20: 11-18, a porta-voz da ressurreição]…” (HAAG, 2018: 9). Se estivéssemos na Europa Medieval, onde os gnósticos cátaros e templários foram impiedosamente perseguidos por uma instituição que foi a força motriz da misoginia ocidental e ainda hoje não permite que mulheres participem de conclaves (eleição de um novo papa) ou celebrem missas, o que nosso trovador Juramidã estaria codificando no presente versículo?

 

VERSOS 1 E 2: “ESTRELA DO UNIVERSO QUE ME PARECE UM JARDIM”

A “Estrela do Universo” é a “(…) Alma Universal (Alma do Mundo) que é idêntica ao Espírito de Deus” (JUNG, 1984: 128). “Lembramos ainda que certos sectários do início do cristianismo atribuíam ao Espírito Santo (Alma do Mundo, Lua) significado maternal” (JUNG, 2011: 168). É o reino do encanto onde tudo é belo, harmonioso e perfumado. O reino onde a força da Anima desperta para o mais puro e pleno sentido da Vida. Reino da sensibilidade, do sonho maternal da concepção, de Madalena emocionada no horto da ressurreição… Enquanto o sol despontava, em lágrimas prismáticas o amado ela reencontrava – só o coração enxerga o que os olhos não podem ver. Que lindo alvorecer! Obnubilado pelas nuvens sombrias do patriarcado…

 

MADALENA CANCELADA NO JARDIM: AS RAÍZES DA NEGAÇÃO DA DEUSA-MULHER

Embora algumas fontes não confirmem a autoria, atribui-se a Clarice Lispector esta frase: “Até onde posso, vou deixando o melhor de mim. Se alguém não viu, foi porque não me sentiu com o coração”. Por essa razão, os amigos de Pedro demoraram a compreender o que a Dama do Noûs estava a dizer (Jo 20: 9-18). E isso levou – anos depois, frise-se bem – os redatores dos Evangelhos a tecerem, como epilogo, quatro belos contos de ninar acessíveis ao populacho não iniciado, e que se transformaram em dogma de fé em Roma, fortaleza inexpugnável do papado mitomaníaco e sexista: é o que revela em sequência a Epístola de Paulo ao Coríntios, o primeiro documento a arrolar as testemunhas da ressurreição, datado em 56-57 d. C., mais ou menos 10 anos antes do primeiro Evangelho ser escrito (BROWN, 2012: 679). Vejamos 1 Cor 14: 34-35: “As mulheres estejam caladas nas igrejas. (…) Se, porém, querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; pois é vergonhoso que a mulheres falem nas igrejas” (BÍBLIA, 2007). Apenas dez versículos depois, Madalena é excluída – calada! – da lista de testemunhas da ressurreição, que passa a ter em Pedro a principal: “Apareceu a Cefas, e depois aos Doze” (1 Cor 15: 5). Lucas, que era discípulo de Paulo (2 Tm 4: 11), muito prestigiado por este, o “médico amado” de Colossenses 4: 14, também ocuta a primazia de Madalena e a entrega a Pedro: “Acharam aí reunidos os onze [Judas estava morto] e seus companheiros, que disseram: “É verdade! O Senhor ressuscitou e apareceu a Simão! (Lc 24, 34).

Onde está Madalena nesse momento, considerando que o Evangelho de João só surgiria 50 anos depois, por volta de 100 d. C (BROWN 2012: 461)? Sua exclusão é proposital, porque negando-a o testemunho, nega-se a gnose de Jesus, na Estrela do Jardim, a “Portadora da Luz”, porta-voz da ressurreição; nega-se a deusa-mulher. Sim, é o próprio Lucas que relata em seu Atos dos Apóstolos, a crítica pública e desprezo de seu mestre Paulo a Deusa quando o autoproclamado apóstolo chegou a Éfeso e ficou indignado com a “idolatria” onde localizava-se o maravilhoso templo de Ártemis (Diana), uma das sete maravilhas do mundo antigo (At 19: 26-28). Como Ártemis era outro dos incontáveis nomes de Ísis, a deusa que ressuscitou seu consorte Osíris (“Jesus”), Paulo e Lucas, conhecedores das “religiões de mistérios” do mundo greco-romano, jamais deixariam o casal sagrado a sós no jardim da ressurreição como fez providencialmente o Evangelho atribuído a João décadas depois; ainda assim, com ardis grotescos que inclui a censura “não me toques Madalena” (Jo 20: 17), um acréscimo posterior de redatores (BROWN, 2020, 1469-70. Vol. 2).

Comenta cirurgicamente o historiador Michael Haag, sobre aquele que precedeu os Evangelhos e os influenciou sobremaneira: “(…) Paulo exclui todas as mulheres de seu mistério de Jesus; Maria Madalena não é mencionada sequer uma vez por Paulo, nem o é Maria, mãe de Jesus, nem qualquer outra mulher em sua vida. Na versão de Paulo dos mistérios, as mulheres não podiam ter lugar; fiel às raízes monoteístas judaicas de Paulo, o mistério de renascimento e salvação pertence apenas a Jesus Cristo” (HAAG, 2018: 191). O resgate da deusa-mulher é celebrado por Juramidã em tom efusivo no hino 64, 7: “Eu dou viva a Virgem Mãe/Viva suas companheiras/Nos proteja neste mundo/Vós como Mãe verdadeira” – através de suas semelhanças desde quando somos crianças. Curiosamente, o significado no nome Ártemis em grego, a deusa depreciada em Atos, é ““são e salvo” – isto é, a deusa que dá refúgio” (JACOBOVIC, 2015: 106).

Segundo os ensinos rosacruz, apreciados por Mestre Irineu, “Alquimicamente, o jardim é o local sagrado; o lugar onde ocorre a transmutação. Na alquimia transcendental, essa transmutação é espiritual; a evolução do Eu interior. O jardim, assim, representa o elemento divino no homem e no mundo” (ORDEM ROSACRUZ, 2000: 140) . O mitólogo Joseph Campbell nos dá pista de uma das possíveis fontes utilizadas pelos escribas de João – reinventa-se os mitos! –  na composição da cena da aparição de Jesus a Madalena no jardim, símbolo da ressurreição do Eu, da totalidade cósmica, da fertilidade, onde Zeus se casou com Hera:  “(…) A pobre deusa Ísis [Madalena chora em Jo 20:13], cujo marido tinha sido lançado no Nilo, começou a procurar seu corpo [“Porque levaram meu senhor e não sei onde puseram” em Jo 20:13]. Este tema da procura do deus que é o esposo da alma é um tema mitológico primordial, nesse período: o tema da Deusa que parte em busca do esposo ou amado perdido e, graças à lealdade e a descida ao reino da morte, consegue resgatá-lo [“Disse-lhe Jesus: Maria!” em Jo 20:16] “(CAMPBELL, 1990:187. Colchetes meus).

Dois mil anos se passaram e na floresta, jardim da Rainha-Deusa-Mãe, uma mulher por nome Clara (claro, a iluminada!) desce até o “reino da morte”, a Terra, para ressuscitar (despertar) seu lindo esposo adormecido. A propósito, no mito fundante do Daime, segundo a biografia mais completa de que dispomos, essa entidade feminina além de “Clara” também é chamada de “Mulher” (MOREIRA & MACRAE, 2011: 94). O antropólogo Clodomir Monteiro, um dos primeiros autores do universo daimista, em seu clássico O Palácio de Juramidam, revela um mistério: “A Virgem Mãe entregou a missão a Irineu Serra, mas voltou encarnada na pessoa de Peregrina Gomes Serra. Ela é vista no astral como a “Rainha da Floresta”…” (MONTEIRO, 1983: 77). Ela é a Madalena-Sophia da história. Torna-se claro e coerente o motivo pelo qual, em seu Centro, ela não se dobrou ao apelo vaticanista no Daime: “igreja”, Credo no Terço e festejo de São Pedro – influências com raízes claramente patriarcais que Juramidã removeu de sua doutrina. O que cada um pensa sobre isso, deve ser respeitado, mas sempre pertencerá ao âmbito da subjetividade. Minha pauta baseia-se na objetividade, o fato histórico.

Está explícito que Raimundo Irineu Serra sempre fez questão de uma companheira ao lado. Antes de madrinha Peregrina, cujo casamento deu-se em 15 de setembro de 1956, foram companheiras em diferentes períodos, inclusive com a geração de um casal de filhos (CARIOCA, 2000: 30). Se vivêssemos na cultura judaica, não haveria nenhum desabono ao Messias por isso, mas para a tradição fantasiosa e castradora eclesial, romana e protestante, dizer que essa é a história do Messias que eles aguardam, soa herege, escandaloso e insano. Jesus só será reconhecido em sua volta quando ele for completamente despido da exorbitância sobrenatural com a qual os verdadeiros hereges o vestiram, pois como afirma o rabino Aryeh Kaplan: “O próprio Messias não é visto como um ser sobre-humano, mas como um líder inspirado…” (KAPLAN, 2003: 41). Mas isso não interessa aos mercadores da fé que perpetuam o mito gerador de manipulações, dividendos e ilusões.

 

VERSOS 3 E 4: “ASSIM COMO SOIS BRILHANTES/QUERO QUE BRILHES A MIM”.

No hino 19, O Amor Eternamente, declara-se: “A Virgem Mãe que me ensinou/Eu de vós não devo apartar-me…” (19, 3). Assim, a mesma Estrela da vivência iniciática de Lua Branca se faz presente no hino 41, Estrela D’Água: “Vou chamar a Estrela d’Água/Para vir me iluminar/Para vir me iluminar/Para vir me iluminar…” (41: 1). Vamos a um artefato medieval pertencente à “heresia do Graal”, obviamente condenado pela Igreja. Refiro-me às cartas do Tarô, especificamente a de número XVII, A Estrela.

 

 

Apraz-me a interpretação da historiadora Margaret Starbird: “A Estrela também pode ser uma referência ao signo astrológico de Aquário, o Aguadeiro, a Nova Era cujo símbolo profetiza a dissolução da elite patriarcal dominante por meio da água do feminino e do Espírito da Verdade. A água derramada nessa carta fará o deserto florescer nos séculos que virão” (STARBIRD, 2004: 127). O Cruzeiro é essa profecia do “florescimento” cumprida, inclusive na repetição exaustiva das palavras “jardim” (17 vezes) e flor ou flores (18 vezes), pois “No judaísmo, espera-se do Messias que ele introduza os judeus no jardim do Éden” (BÍBLIA, 2015: 2432, n. “e”). Repete-se a expressão “jardim de belas flores” por três vezes no hino 79, Jardineiro. Em relação aos dois jarros, um de ouro e outro de prata, “As águas masculinas e femininas são a expressão simbólica da união universal das potencialidades contidas na Fonte universal, na Totalidade, o Tao da filosofia chinesa…” (CAVALCANTI, 1997:157).  Uma síntese cabal do que foi afirmado é a magia de uma das mais enigmáticas e encantadoras afirmações de Mestre Irineu: “Completei o meu Cruzeiro com 132 flores…” (52: 3). O homem que se faz pleno (completo, universal) com um símbolo considerado feminino, as flores! E haveria de ser 132 (1+ 3 + 2 = 6), o número da completude. É o que afirma Santo Agostinho; por ironia, consagrado artífice da misoginia: “Deus fez o mundo em seis dias porque o 6 é o número perfeito” (LIBERATO, 2005: 19). Influência de seus estudos na escola pitagórica, que considerava um número perfeito quando a soma de suas partes é igual ao próprio número: 1 (um sexto de 6) + 3 (metade de 6) + 2 (um terço de 6) = 6 (PARUCKER, 2005: 30).

 

Ô MÃE DIVINA DO CORAÇÃO

LÁ NAS ALTURAS ONDE ESTÁS

MINHA MÁE LÁ NO CÉU

DAI-ME O PERDÃO.

 

Se este é o hino em que a palavra “coração” é repetida mais vezes (5), também é em Lua Branca que o vocábulo “perdão” mais é usado (4). A dedução parece óbvia: no coração se dá o mistério do perdão. O autoperdão, o perdão ao semelhante e, conseguinte, o perdão divino. A palavra deste grande Mestre comove e inspira sobremaneira. Refiro-me à chave contida no último hino em que a palavra “perdão” aparece: “Eu peço a vós bem contrito/Fazendo minhas orações/Peço a vós a santa luz/Para iluminar o meu perdão” (122: 3). O perdão necessita ser iluminado – compreendido. Sim, pela luz mestra proclamada no hino que imediatamente antecede ao do batismo (consciência): “Esta luz é da floresta/Que ninguém não conhecia/Quem veio me entregar/Foi a sempre virgem Maria” (65:2). Segundo a teologia peculiar ao Evangelho atribuído a João, que não faz parte dos sinópticos (“vistos de um mesmo modo”) Marcos, Mateus e Lucas, Jesus, a Luz que até então ninguém conhecia na Palestina, faz-se conhecer em poder e glória nas bodas de Caná da Galiléia, lugar onde se manifesta “o princípio dos sinais” e a prova inicial dos novo tempo messiânico (Jo 2: 11). Fundamental a explicação deste grande especialista no Evangelho de João: ““Sinal” indica o ponto de vista humano no qual a atenção está voltada não tanto para o miraculoso, mas para aquilo que é revelado pelo milagre para os que conseguem enxergar mais longe” (BROWN, 2012: 466, n. 15).  A seguir, um olhar vanguardista e breve desse mistério e o seu significado decisivo.

 

O VINHO DE CANÁ E O VINHO DA FLORESTA: TRANSIÇÃO DE TESTAMENTOS

A Ayahuasca, que tem no Daime uma fórmula específica desenvolvida por Mestre Irineu, também é conhecida por “Vinho dos Mortos”, ou como prefiro, “Vinho das Almas” (ARAÚJO: 1999: 13). No Antigo Testamento, a promessa do vinho era um sinal dos tempos messiânicos (Am 9: 14; Jr 31: 15; Zc 9: 15). Segundo Isaías 55: 1, deveria ser gratuito: “Ah! Todos que tendes sede, vinde à água. Vós, os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; comprai, sem dinheiro e sem pagar, vinho e leite”. O “leite” é uma símbolo da pureza da Palavra ou a Palavra não adulterada (1 Pedro 2: 2). Não consta que Jesus tenha cobrado qualquer valor por suas curas e sermões, o que remete a Mestre Irineu e sua relação estritamente filantrópica com o Daime.

Os “tempos messiânicos” cumpridos em Jesus, que tem nas bodas de Caná da Galiléia um evento chave, contém um mistério: o domínio latente da Mãe divina (JO 2: 1-11). O exegeta José Hipólito de Moura Faria é muito feliz em sua exposição: ““Eles não tem mais vinho”, informa Ela a seu Filho. Ao usar o pronome na terceira pessoa, Maria não se está incluindo mais na categoria do “Israel da espera” [dos tempos messiânicos]. Ela própria já fez a transição, mas, ainda sim, faz-se porta-voz dos que percebem que as núpcias antigas de Israel com seu Deus, mediante a purificação legal, já se esgotaram (as talhas de pedra, com a água da purificação, estão vazias e o vinho acabou). Diante dessa situação, Ela pede a intervenção do Filho, pois sabe que Ele traz o vinho novo, o vinho dos tempos messiânicos, que representa a sangue redentor” (FARIA, 2013: 23).

O hinário de Maria Damião, que compõe a base doutrinária do Daime, na década de 1930/40 anunciava: “O tempo chegou feliz daqueles/Que seguiu e gravou este amor/A minha Mãe há muito tempo/Os ensinos para todos ela mandou” (19:4). O Mestre do Evangelho Eterno (Ap 14, 6) traz o Vinho Novo da promessa da última ceia, que citei no primeiro parágrafo deste texto. Novamente através de sua Mãe. Agora não mais como coadjuvante, mas protagonista no símbolo da “proa”: “Aí eu botei os olhos/Aí vem uma canoa/Feita de ouro e prata/E uma senhora na proa” (84:4). O simbolismo do “vinho novo” de Caná, que substitui o “vinho antigo” findado, nas palavras exatas de Raymond Brown, “(…) É a substituição das instituições e dos pontos de vista religiosos judaicos…” (BROWN, 2020: 297). E “Na tradição sinótica, aparentemente no contexto de uma festa nupcial (Mc 2, 19), encontramos Jesus usando um simbolismo de um vinho novo em odres velhos a fim de comparar seu novo ensino com os costumes dos fariseus” (p. 298). Justifica-se o motivo pelo qual Maria Damião afirma que “O tempo está demudado/Mudou de governo/Novas revoluções/Aqui com os estrangeiros” (46: 7) – os novos galileus… Galiléia dos estrangeiros, sinonímia para gentios (GENTIO, 2009).

No mistério da água que se transforma em vinho, em Caná e na Floresta, a Mãe sempre está junto ao Filho, pois Ela é em sua natureza feminina, na brilhante definição de Erich Neumann, a “Senhora da Transformação” (NEUMANN, 2021: 283-284). A Força que transforma água em vinho é a mesma que está na terra, que da semente alimenta a gente e na mulher dá vida aos inocentes; que está na Lua e transforma luz em poesia abrandando a crueza dos dias. Agradeçamos a Senhora das Bodas e a seu Filho querido por mais uma oportunidade de pelo Espírito sermos remidos! Amém.

 

Nota 1: para outros significados do uso da palavra “estrangeiro (s)” por Maria Damião, vide Nota Explicativa ao final do texto do post Apresentação. Link: https://evangelhodejuramida.com.br/apresentacao/

Nota 2: algum leitor pode questionar: Por acaso o vinho das Bodas de Caná era um psicoativo para ser comparado ao Daime? O escriba primordial do Evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito e que serviu de referência aos outros, principalmente Mateus e Lucas, inseriu dois códigos que apontam para tal possibilidade. Um desses códigos foi usado no Evangelho de João, no qual as bodas de Caná é narrada. Quando for a hora, terei um imenso prazer em publicar essa teoria.

Nota 3: em relação a primazia de Marcos: para estudar a bibliogênese dos Evangelhos, o que inclui a cronologia, recomendo a terceira obra de Raymond Brown arrolada nas “Referências”. Brown, teólogo liberal, é considerado o maior biblicista católico contemporâneo. Aviso que a obra Introdução ao Novo Testamento contém 1135 páginas em edição refinada da Paulinas.

 

REFERÊNCIAS:

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BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém: Nova Edição, Revista e Ampliada. São Paulo: Paulus, 2002;

BÍBLIA. Português. Bíblia Tradução Ecumênica (TAB). 2ª Ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015;

BÍBLIA. Português. Bíblia Hebraica. São Paulo: Sêfer, 2006;

BÍBLIA. Português. Novo Testamento. Tradução de Haroldo Dutra Dias. Brasília (DF): Conselho Espírita Internacional, 2010;

BROWN, Raymond. Comentário ao Evangelho Segundo João. Volume 1 (1-12): introdução, tradução e notas. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2020;

_________. Comentário ao Evangelho Segundo João. Volume 2 (13-21): introdução, tradução e notas. Santo André: Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2020;

 _________.Introdução Ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2012;

CAMPBELL, Joseph. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athena, 1990;

CANTALAMESSA, Raniero. Vem, Espírito Criador! São Paulo: Editora Canção Nova, 2014;

CAVALCANTI, Raïssa. Mitos Da ÁguaAs Imagens da Alma No Seu Caminho Evolutivo. São Paulo: Cultrix, 1997;

DUNN, James D.G. Jesus, Paulo e os Evangelhos. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2017;

ESCHENBACH, Wolfram von. Parsifal. 4ª ed. São Paulo: Antroposófica, 2015;

FARIA, José Hipólito de Moura. Bases Bíblicas do Culto a Maria. Belo Horizonte: Usina do Livro Editora, 2013;

FLUSSER, David. O Judaísmo e as Origens do Cristianismo, Volume 1. Rio de Janeiro: Imago, 2000;

FORTES, Tania. Rabi Akiva e Bar Kohva: Em Busca do Messias. São Paulo: R. Cohen Editora, 2009;

GAUTIER, Jean-François. Vinho. Porto Alegre, RS: L & PM, 2009;

GENTIO. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2009;

GONZÁLEZ-WIPPLER, Migene. Jesus e a Cabala Mística: Chaves para o Reino. São Paulo: Pensamento, 2006;

HAAG, Michael. Maria Madalena: Da Bíblia ao Código Da Vinci: Companheira de Jesus, deusa, prostituta, ícone feminista. Rio de Janeiro, Zahar, 2018.

JACOBOVICI, Simcha; WILSON, Barrie. A Vida Privada de Jesus. Lisboa, Portugal: Clube do Autor, 2015;

JULIEN, Lucienne. Os Cátaros e o Catarismo: Do Espírito à Perseguição. São Paulo: IBRASA, 1993;

JUNG, Carl Gustav. A Natureza da Psique. Petrópolis (RJ): Vozes, 1984;

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JUNG, Emma; FRANZ, Marie-Louise Von. A Lenda do Graal Do Ponto de Vista Psicológico. São Paulo: Cultrix, 1980;

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LIBERATO, Aparecida. O Poder Que Vem do Seu Nome/Aparecida Liberato & Beto Junqueira. Rio de Janeiro: Sextante, 2005. P. 19;

MACRAE, Edward. Guiado Pela Lua: xamanismo e uso ritual da ayahuasca no culto do Santo Daime. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992;

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Respostas de 12

  1. Gratidão por mais esse estudo, irmão! A gente pensa que conhece o Daime e vc mostra quantas camadas mais há de se conhecer, esperando o dia em que vou encontrar uma igreja que siga realmente a doutrina do Mestre, pra seguir nesses estudos. Que a Deusa te abençoe!

  2. Foi com certa dificuldade que pude ler a sua exegese dos hinos de mestre Irineu cuja extensão ultrapassa de muito a simples tarefa devocional do fardado. Foi um trabalho de microscopista a esmiuçar o significado oculto dos hinos para poder alcançar a graça dos seus conteúdos. Trabalho proveitoso.

  3. Texto intrigante que pode até ser questionado, mas jamais desprezado. Embasado em comentários de historiadores, teólogos e estudiosos dos antigos mistérios, o artigo nos remete a uma antiga saga – o Santo Graal. Impossível não se emocionar com a história dos templários e com o enigma de Madalena, desespero dos homens que dominaram o Ocidente com uma religião distorcida e corrompida em suas bases. O maior mistério do relato, a meu ver, é destacado pelo próprio autor na Nota 2: “algum leitor pode questionar: Por acaso o vinho das Bodas de Caná era um psicoativo para ser comparado ao Daime? O escriba primordial do Evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito e que serviu de referência aos outros, principalmente Mateus e Lucas, inseriu dois códigos que apontam para tal possibilidade. Um desses códigos foi usado no Evangelho de João, no qual as bodas de Caná é narrada. Quando for a hora, terei um imenso prazer em publicar essa teoria.” Anseio ler e compreender essa parte da doutrina.

    1. Grato, Ismael! Algumas exegeses que apresento e apresentarei são incomuns, até mesmo revolucionárias. Não me satisfaz o lugar-comum. Além do que, inovar é preciso. Grande abraço fraterno 💕

  4. Mais um texto fantástico, gratidão querido mano Florestan!! Muitas reflexões e um estudo fino para aqueles que gostam de se aprofundar um pouco além nos mistérios da nossa doutrina. Abraços fraternos!

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