Hino 3 – Ripi

Facebook
Twitter
WhatsApp

 

RETOMANDO O FIO DA MEADA – TUPERCI, HINO 2

O Cruzeiro, o Evangelho de Juramidã, é um testemunho coerente que encerra princípio, meio e fim harmonizados em uma sequência lógica. Portanto, Ripi é o próximo capítulo da saga de Mestre Irineu ao encontrar o graal amazônico, o Daime. Sugiro a leitura da interpretação do hino 02, Tuperci, para que melhor se compreenda uma das dimensões da primeira e única estrofe do hino 3 (Vide “Links” ao final do texto, e clique).

 

RIPI, RIPI, RIPI

RIPI, RIPI, IAIÁ (ÌYÁ ÌYÁ)

SE VOCÊ NÃO QUERIA

PARA QUE VEIO ME ENGANAR?

 

Neste subtítulo, atenho-me às últimas duas frases. A pergunta espelha o paradoxo tuperciniano, a contradição, a esfera do dualismo simbolizada no número do hino, o dois. Igualmente, o homem que não conciliou o que lhe é complementar e ainda é reconhecido como oposto em sua consciência ordinária. A Mãe Divina contemplada no êxtase iniciático de Irineu em Lua Branca e que, de certa forma o repreende no hino seguinte ao mostrar-lhe cruamente sua ignorância e tolice, afirmando “Tuperci não me conhece/Tu não sabes me apreciar/Tu não sabes me compreender/A minha flor cor de jaci (y)”, volta a lhe chamar à atenção de forma quase intimativa: “Se você não queria/Para que veio me enganar?”.

Trazendo à memória o mito do eterno retorno de Mircea Eliade ou o conceito filosófico do eterno retorno presente em Eclesiastes 1, 9 – “O que foi será, o que se fez se tornará a fazer: não há nada novo debaixo do Sol!” -, a análise de Emma Jung acerca do mesmo dualismo que o herói Parsifal manifestava no início de sua busca pelo Graal, traz luz sobre a indagação feita pela Senhora em Ripi: “(…) Uma figura da Sofia, que tem a intenção de fazer Perceval ultrapassar os antagonismos” (JUNG, 1980: 193); “(…) Visando à conquista do Graal, uma vez que por força de sua origem era seu herdeiro legítimo” (ESCHENBACH, 2015: 119; 219). A Mãe Divina usa o método consagrado por Sócrates – presente na obra de Mestre Irineu – denominado dialética, que é “ (…) A arte de conduzir uma discussão; o método científico para desenvolver o conhecimento por meio de perguntas e respostas; o método para aprender uma realidade, captando sua essência ou forma; o método pelo qual o lógos (razão ou pensamento) entra em contato direto e imediato com o objeto. A dialética é uma téchne [saber por ver] perfeita da alma” (CHAUÍ,  1994: 194).

A complementação da filósofa Margarida Nichele Paulo é muito pertinente em relação ao processo vivido por Irineu em Ripi: “Separando e unindo [Se você não queria/Para que veio me enganar?”], a dialética purifica a essência, liberando-a de toda contradição interna para apreendê-la em sua identidade real”! (PAULO, 1996: 69).  Irineu em seu sono tuperciniano, cheio de si mesmo, duvidoso, carece despertar, ou como diz o filósofo Julius Evola em O Mistério do Graal: “Superar o “sono” significa, em todas as tradições iniciáticas, participar numa lucidez transcendente, liberta dos condicionamentos da existência material e individual” (EVOLA, 1978: 140). A pergunta feita a Irineu, ecoa aquelas que a personagem Sigune – uma das várias mulheres que personificam a Anima no épico romance medieval – faz a Parsifal, ainda claudicante em sua missão: “Dizei-me, pois: qual é vossa situação em relação ao Graal? Apreendestes finalmente o sentido que ele encerra? Que resultados colhestes ao longo de vossa busca?” (p. 284). Não é sem propósito o próximo hino  04, Tarumim – apresentar a “fonte d’ água”, outro símbolo feminino, que saciará em Irineu a sede de seu próprio ser. O hino Ripi é esta ponte entre a superficialidade tuperciniana e a profundidade tarumínica. A Mãe Divina instiga à travessia: “Ripi, ripi, ripi/Ripi, ripi, Ìyá Ìyá/Se você não queria/Para que veio me enganar?”.

NOTA: repetindo o que foi revelado na interpretação do hino Tuperci: segundo depoimento de Luiz Mendes do Nascimento a minha pessoa, o jovem Irineu, isolado nas matas, duvidou cinco anos da missão que vinha recebendo em suas experiências com a Ayahuasca.

 

RIPI, UMA PALAVRA TUPI

Na exegese de Tuperci, trouxe à baila um dos mistérios do profeta Raimundo Gomes da Silva em seu Ramalho, hinário canônico do CICLU-Alto Santo: “Sigo sempre o meu destino/Falando meu idioma/Só não falo português/Porque o povo anda na ronda” (102:3). Ripi é mais um vocábulo do idioma de Juramidã. No hino 02 desmistifiquei as palavras tuperci, barum e marum como sendo “entidades”. A exemplo de ripi, não o são. Segundo o filólogo Francisco da Silveira Bueno, professor emérito da Universidade de São Paulo, a palavra “ripi” é de origem tupi e significa: “fundo”, como adjetivo, e  “fundura”, como substantivo (SILVEIRA BUENO, 1984: 280). Vide foto da página do livro do autor, Vocabulário Tupi-Guarani Português:

 

ÌYÁ ÌYÁ, UMA EXPRESSÃO IORUBÁ

Segundo o dicionário iorubá-português do Google Tradutor, significa “mãe da mãe”, ou seja, avó. Vide o print:

“ìyá” significa “mãe”. “Ìyá ìyá”, “mãe duas vezes” (avó). Sem dúvidas, e veremos o porquê à frente, estamos diante do orixá Nanã, a “Grande Vó” (EGÍDIO, 2019: 11); “(…) Cujo nome, do original Nàná é por si só um termo de deferência utilizado na região de Ashanti, para as pessoas idosas e respeitáveis” (MARTINS, 2020: 54). A autora, ialorixá, amplia o significado afirmando que, Nanã “É considerada Ìyá Nlá, a grande mãe da criação…” (p. 64) – observe a semelhança fonética com Iaiá. Ainda no que tange à etimologia, o dicionário Houaiss explica a origem da palavra “Iaiá” como uma alteração de “sinhá”, “senhora”, e a sinonimiza com “nanã” (IAIÁ, 2009). Ademais, como estamos perante uma tradição oral, vislumbro a grafia Iaiá como uma transliteração do iorubá ìyá ìyá.

 

ÌYÁ ÌYÁ/NÀNÁ NO ARCABOUÇO D’O CRUZEIRO

A pergunta que espelha a ambiguidade (na acepção “incerteza”), “Se você não queria/Para que veio me enganar?”, revela o orixá interlocutor: “Nanã é a senhora da ambiguidade [esfingética] que não engana” (MARTINS: 2020: 19). Em exata sintonia, o  sentido de “fundo” e “profundidade” do tupi ripi é pertinente ao iorubá Ìyá Ìyá/Nàná, cujo um dos epítetos é “Senhora das Profundezas” (EGÍDIO, 2019: 13). Não é obra do acaso a orixá aparecer no hino do batismo, 66, São João, sincretizada à avó materna de Jesus: “Jesus estava vestido/Com sua roupa cor de cana/Dando viva ao Pai eterno/E viva a Senhora Santana”. É amplamente difundido na literatura candomblecista e umbandista o sincretismo entre Nanã e Nossa Senhora Sant’ Ana (RIBEIRO, 1996: 80). Batismo vem do grego baptismós e significa “imersão” (BATISMO, 2009). Conseguinte, a umbandista Cris Egídio traz luz ao mistério, discorrendo sobre as características da mais antiga orixá feminina: “Essa Mãe Divina exerce poderes sobre as profundezas escondidas nas aparências, as profundezas interiores dos seres” (EGÍDIO, 2019: 53). Em verdade, Nanã, a grande mãe ancestral encarna e traz a força geradora do novo homem pós-batismo, que a autora denomina “fator amadurecedor” (p. 53). Além disso, aparece no hino 66, São João, por ser considerada “(…) A grande rainha da justiça, o que a faz tão poderosa quanto Xangô, o padroeiro da justiça” (MARTINS, 2008:64).

Batismo, o mergulho na consciência, traz outro título da orixá, a “Senhora da Transcendência” (EGÍDIO, 2019: 12). Transformado, do denso ao etéreo, três hinos depois o Mestre apresenta-se como um ser alado: “Sou passarinho e tenho dono/E o meu dono tem poder” (69: 3) – Nanã Buruquê! Segundo o sociólogo, babalorixá e babalaô Fernandez Portugal Filho, “É considerada a Suprema Sacerdotisa das Ìyá Àgbà [“Mães Rainhas”], que dominam os pássaros, que são seus mais fiéis mensageiros” (PORTUGAL FILHO, 2022: 20)! Associei Nanã Buruquê ao “dono” que tem poder, pois em um passado muito distante, especificamente no período Neolítico, Deus era cultuado como feminino, inclusive na África (STARBIRD, 2004: 43; 138): “Entre os ewe [jejes] e os fon da República do Benin (Daomé), Deus é conhecido como Nanã Buruku. (…) Em ewe e fon, a expressão Nana Buruku tem o seguinte significado: Nana = velho ou antigo / Buruku é o nome de Deus. Assim, Nanã Buruku significa Deus Antigo” (RIBEIRO, 1996: 79).

Nanã, igualmente aparece no último hino, Pisei na Terra Fria, no qual Mestre Irineu replanta uma parte do mito iorubá da criação: “A minha Mãe que nos criou/E me dá todos os ensinos/A matéria eu entrego a Ela/E o meu espírito ao Divino” (129: 2). Os dois primeiros versos coadunam-se a outro cognome da mais velha das orixás, “Guardiã do Saber Ancestral” (EGÍDIO, 2019: 11). Quanto aos dois últimos versos: “Obatalá [Oxalá] experimentara vários elementos para confeccionar a criatura sem obter resultado favorável. Decidiu apelar para Nanã. A aiabá [Rainha] aceitou colaborar, impondo uma condição: seu elemento, o barro, retornaria para ela após o período de passagem da criatura no aiê [mundo físico]” (MARTINS, 2008: 51). A autora arremata, desta vez nos destinando ao hino 25, Oferecimento: “Nanã é, portanto, coparticipante na criação. Oxalá e Nanã caminham juntos” (MARTINS, 2008: 51) – no verbo de Juramidã: “Eu ofereço esses cânticos/Que agora se cantou/Ao Rei e a Rainha/Do universo criador” (25:5).

Ronilda Iyakemi Ribeiro, em sua tese de doutorado transformada em livro, Alma Africana no Brasil, Os Iorubás, remete-nos ao hino 33, Papai Velho, em que a restituição operada por Mestre Irineu a Ìya Ìyá/Nanã em Pisei Na Terra Fria “(…) É expressa pelo fato de Nanã carregar na mão direita o ibiri [seu bastão], que significa: meu descendente o encontrou e o trouxe de volta para mim” (RIBEIRO, 1996: 85). Os poderes dos pais ancestrais simbolizados nos bastão de Nanã, o ibiri, e no de Oxalá, o paxorô, haviam sido entregues muitos anos antes: “Papai velho e Mamãe velha/Vós me dê o meu bastão/Sou Eu Sou Eu Sou Eu/Com a minha caducação” (33: 1) – Eu Sou Criador. O bastão (cajado) é um utensílio usado por devotos de Nanã na África em suas peregrinações iniciáticas e em danças litúrgicas que a rememoram (VERGER: 2002: 239). Outra vez, deparamo-nos com Nàná e seu filho peregrino – “Perguntei a todo mundo por onde vai o caminho? “ (94: 1) – no hino 104, 2-3: “Vou seguindo, vou seguindo/Os passos que Deus me dá/A minha memória divina/Eu tenho que apresentar/A minha Mãe que me ensina/Me diz tudo que eu quiser/Sou filho desta verdade/E meu pai é São José” – Nanã também é conhecida como “Senhora da Memória Ancestral” (EGÍDIO, 2019: 54). A autora alumia a passagem do hino: “Ela [a memória ancestral/imortal] é uma evocação do passado, a base sobre a qual se inscrevem os fatos e coisas que foram escolhidos e gravados porque tem significados e sentido para nós, porque tem aspectos afetivos, sentimentais e valorativos” (p. 55).

Para encerrar esta abordagem introdutória acerca da grande importância e alcance de Ìyá Ìyá (Nanã) na boa-nova de Mestre Irineu, além de estar presente no hino 66 (meio do hinário) e no hino 129 (fim), manifesta-se no início, hino 01, Lua Branca, justificando mais um dos seus títulos: “Senhora do Início, Meio e Fim” – nascimento, vida e morte (EGÍDIO, 2019: 42). Isso porque em relação a Lua Branca“Deus te salve ó lua branca/Da luz tão prateada/Tu sois minha protetora/De Deus tu sois estimada” (01:1) -,  o branco remonta a “Nanã funfun lele/Nanã branca branca-neve” (RIBEIRO, 1996: 83). Quanto à prata, “(…) É um metal calmante; age como um portal para o subconsciente e para o inconsciente e ajuda a serenar e a explorar os reinos interiores profundos da emoção e da intuição e a abrir os sentidos da mediunidade e da sensibilidade. A prata é de Nanã” (EGÍDIO, 2019: 156). De mais a mais, “Quando as pessoas querem ter discernimento, pedem a Nanã que lhes clareie as mentes” (MARTINS, 2008: 76). Perfeito: tudo o que a persona Tuperci necessitava para atravessar a ponte da redenção: da inconsciência à consciência; da parvoíce à sabedoria, da rudeza à flor da pele  – Jacy enquanto Lua, alma. Para melhor entendermos esse resgate que Raimundo Irineu Serra faz de sua ancestralidade africana, convém abordarmos o próximo subtítulo.

 

A IGREJA ESCRAVAGISTA E ACULTURAÇÃO CATÓLICA

Ripi é o menor hino d’O Cruzeiro (os mesmos 4 versos de Tuperci, com menos letras: 59 x 81). No entanto, sua abrangência e influência o tornam crucial no oráculo de Juramidã. Além de prestigiar a língua tupi, primeiro com jacy (hino 02), e agora com ripi, Mestre Irineu traz à cena de sua “ópera cabocla”, expressão cunhada pelo amigo e sociólogo Juarez Duarte Bomfim, um orixá, Nanã  (Ìyá Ìyá), replantando a religiosidade de seus ancestrais, o que pode começar a ser rastreado em sua cidade natal, onde segundo o tratado biográfico Eu Venho de Longe, “Os avós maternos de Raimundo Irineu de Mattos [nome de batismo], André Cursino Serra e Leopoldina Filomena Madeira, eram escravos de Salustiano José Serra, comerciante de secos e molhados…” (MOREIRA & MACRAE, 2011: 69). No que tange a essa época, a historiadora nativa Gracilene Pinto, reporta: “A população de São Vicente Férrer em 1866, era de 8.320 habitantes, sendo 6.580 livres e 1.740 escravos” (PINTO, 2001: 19). Seis anos depois, em 1872, um censo oficial apontou 2.920 escravos (p. 19). Entretanto, em relação à prática religiosa dos Mattos e dos Serras, o relato pioneiro de Eduardo Bayer Neto, retrata: “Raimundo Irineu foi batizado pelo venerando padre José Bráulio (sua mãe, dona Joana d Assunção Serra, era católica devotada e em sua família não havia casos próximos de alguém seguir diretamente a orientação dos tradicionais cultos africanos do Maranhão)” (BAYER NETO, 1992: 3). Segundo o depoimento de Daniel Serra, que colhi em sua residência quando ele ainda morava em Rio Branco, dona Joana, sua vó, era uma obstinada devota do terço católico, rezando-o todos os dias e exigindo a presença silenciosa de seus filhos. Quando estive em São Vicente Férrer, em 2005, visitei a humilde casa de dona Rita Serra (falecida em 2021), prima de Mestre Irineu, filha do famoso “tio Paulo”, irmão de Joana, e obtive dela a informação de que a matriarca, sua tia, confeccionava seus terços com sementes da região. Vide foto de minha visita:

Dona Joana pertencia a uma geração aculturada, pois os escravos que aqui chegaram desde o Brasil Colônia foram submetidos a um processo brutal de conversão ao catolicismo. Doutor em teologia católica, o professor Sérgio Sezino Douets Vasconcelos, a quem agradeço a cordialidade de sua atenção e a gentileza do envio do artigo Tópicos Sobre O Papel Da Igreja Em Relação À Escravidão E Religião Negra no Brasil, vai direto ao ponto: “Por meio da catequese e do batismo cristão, foram obrigados a abandonar cultura e religião ancestrais e a “converterem-se” ao cristianismo. Salvo rara exceções, ela [Igreja] foi conivente com a escravidão ao utilizar ela própria da mão-de-obra escrava para a sua sustentação econômica e ter também servido de base ideológica para a justificação religiosa da escravidão” (VASCONCELOS, 2005: 35-36). Após detalhar, ao longo do artigo, a infame postura da Igreja perante os escravos, o professor Sérgio conclui: “O corpo do escravo é marcado a fogo [ferro quente] com o símbolo [da coroa portuguesa] que representa o seu dominador e a sua religião. O primeiro contato do africano com o cristianismo foi um encontro marcado pela dor e pela agressão” (p. 49). Mestre Irineu recobra, através de uma poderosíssima expressão – Ìyá Ìyá – a memória sociocultural e religiosa africana, “(…) Com a recomposição dos pedaços perdidos na longa noite da escravidão”, citando o inspirado jornalista e professor Juarez Tadeu de Paula Xavier (XAVIER, 2010: 214). “Ìyá” significa muito mais que a letra fria da palavra “mãe”; entre os iorubas é uma verdadeira “instituição socio-espiritual”, citando Oyèrónké Oyèwùmi, socióloga nigeriana de origem iorubá da Universidade de Stone Brook, N. Y. (OYÈWÙMI, 2015: 58).

 

MESTRE IRINEU E A RELIGIÃO DOS ORIXÁS: O “CANDOMBLÉ” DE JURAMIDÃ

A doutora Ronilda Iyakemi Ribeiro, casada com um iorubá, remete a origem da palavra “candomblé” à Kandombile, significando “culto e oração” (RIBEIRO, 1996: 10).  Abordarei as similaridades entre o candomblé e o Daime, incluindo um aprofundamento do mistério de Ìyá Ìyá/Nanã, a quem a ialorixá Cléo Martins denomina “Senhora do Princípio Feminino” (MARTINS, 2008: 61); e a umbandista Cris Egídio chama de “Trono Feminino da Evolução” (EGÍDIO, 2019:15). Para Pierre Fatumbi Verger (1902 – 1996), a quem todo estudante de religiões de matriz africana deve um agradecimento, os orixás são os “(…) Deuses dos iorubás, em seus lugares de origem, na África (Nigéria, ex-Daomé e Togo) e no Novo Mundo (Brasil e Antilhas), para onde foram levados, em séculos passados, pelos escravos” (VERGER, 2002: 11).

 

ELOS MÍSTICOS E ÉTICOS ENTRE O CANDOMBLÉ E O DAIME

Não obstante a óbvia diferença litúrgica (que isso fique bem claro!), existem luminares semelhanças entre o candomblé e o Daime, que elencarei a seguir.

 

SOBRE A FORÇA: INTRODUÇÃO

A palavra “força” aparece n’ O Cruzeiro em 17 hinos sendo repetida 37 vezes – algo muito significativo. Para os iorubás, “Sob toda manifestação viva reside uma força vital”, “Uma força, poder ou energia permeia tudo”;  “O valor supremo é a vida, a força, viver forte ou força vital. Essa força não é exclusivamente física ou corporal e sim uma força do ser total, sendo que sua expressão inclui os progressos de ordem material e o prestígio social. Felicidade é possuir muita força e infelicidade é estar privado dela. Toda doença, flagelo, fracasso e adversidade são expressões da ausência de força. (…) A força é adquirível, transmissível, pode aumentar e diminuir até o esgotamento total” (RIBEIRO, 1996: 18).

Segundo o evangelista Lucas, Jesus faz uma promessa cumprida no Pentecostes: “Mas recebereis uma força, a do Espírito Santo que descerá sobre vós…” (At 1: 8). O Espírito Santo é inerente a Mãe Divina e foi masculinizado através da tradução da palavra “espírito”: do hebraico ruach (gênero feminino), passando pela palavra neutra grega pneuma, até chegar ao spiritus sanctus latino (MEIER, 1992: 221; GONZÁLEZ -WIPPLER, 2006: 39; WELBURN, 1991: 302). Nem há necessidade de referendar; basta prestarmos atenção na pista reveladora: no Jordão, na cena do batismo, em que segundo Mestre Irineu, Jesus deu viva a Ìyá Ìyá/Nanã (66: 5), o Espírito se manifesta como pomba (e não pombo) e o carinha com doces palavras: “Tu és meu filho amado, em ti me comprazo” (Mc, 1: 11) – “A Virgem Mãe lhe acompanhou/Ó Beijamim (Benjamim) flor de amor… (Maria Damião: 02: 3); “O tempo chegou feliz daqueles/ Que seguiu e gravou este amor/A minha Mãe há muito tempo/Os ensinos para todos ela mandou” (M. D: 19: 4). Mas em Tuperci,  o filho mais querido, o predileto e preferido (significado de “Benjamim”) ainda estava dormindo na noite escura da inconsciência, sem conhecer, apreciar ou compreender a flor de sua própria alma. Foi quando se revelou o hino Ripi, o oriki.

 

SOBRE A FORÇA: O ORIKI NO HINO RIPI

Oriki, no candomblé, é a evocação e saudação ao orixá;  “Oriki é pois, uma saudação ao ser, referindo-se a sua origem, suas qualidades e seus ancestrais” (RIBEIRO, 1996; 140). Ao invocar seu orixá ancestral e de cabeça, Ìyá Ìyá/Nanã, Mestre Irineu evocava sua própria essência, que “(…) Controla totalmente a personalidade do homem, guiando e ajudando a pessoa desde antes do nascimento, durante toda a vida e após a morte (p. 140).  A antropóloga Karin Barber, especializada em língua iorubá,  revela: “Declamar o oriki de um sujeito é, portanto, um processo de empoderamento. As qualidades latentes de um sujeito são ativadas e aprimoradas. (…) Os orikis despertam as qualidades adormecidas nas pessoas e as trazem à sua plena realização” (OYÈWÙMI, 2015: 69). Exatamente o que a orixá faz neste hino: despertar o sono de Tuperci, que não conhece, não aprecia e não compreende –  seu ser, sua vida e sua missão! Além disso, “É de conhecimento comum que as Ìyá tem um axé especial (poder da palavra) para o qual rotineiramente chamam à atenção quando precisam seguir seu caminho com qualquer parte de sua prole…” (OYÈWÙMI, 2015: 64). O que aprofunda o significado da chamada à responsabilidade “Se você não queria, para que veio me enganar ?!”. Aliás, o tom disciplinador da pergunta é típico de Nanã, qualificada como “(…) Mãe justa, protetora, implacável e severa” (EGÍDIO, 2019: 13). Ao invocá-la através do oriki Ripi, manifesta-se seu axé, poder, comando…

 

SOBRE A FORÇA: O AXÉ DE ÌYÁ ÌYÁ

“Axé também é definido como poder, autoridade, comando, cetro, poder oculto e criativo, um poder que pode dar à luz…” (OYÈWÙMI, 2015: 64-65); “(;…) Poder em estado de energia pura” (VERGER, 2002: 18); “(…) O nome dado pelos iorubas à força vital” (RIBEIRO, 1996: 51). De interesse em relação ao Daime, é o axé, no candomblé, também estar presente no mundo vegetal, através da seiva, considerada como “sangue”, sendo “(…) Substância indispensável para restauração da força”  (RIBEIRO, 1996: 51). Pierre Verger, que testemunhou iniciações dos iorubás na África, reporta: “(…) Os noviços são obrigados a fazer abluções e tomar beberagens vegetais… Essas beberagens e abluções, que contém o axé, a força do Deus, parecem exercer uma ação sobre o cérebro do iniciado e contribuir para deixá-los num estado de entorpecimento e de sugestionabilidade que fará deles criaturas dóceis e aptas a consagração” (VERGER, 2002: 37). O axé (força) de Ìyá Ìyá está na cocção das seivas da Folha e do Cipó, que resultam no Daime. Outro ponto em comum e esclarecedor é sobre quem traz o axé: “A Ìyá Sàngó do lugar ou Ìyá egbé, a “mãe da comunidade”, encontra-se também presente. É ela quem transmite o axé aos novos elégùn” (VERGER, 2002: 38). O que corrobora ser a “força” o domínio da Mãe (Ìyá), o poder conceptivo, gerador e iluminador.

 

SOBRE O ELÉGÙN, MULHER DE ORIXÁ

Voltamos a beber na fonte do babalaô Pierre Verger, doutor em Ciências Africanas pela Sorbonne, grande mestre e devoto da simplicidade: “O orixá é uma força pura, àse [axé] imaterial que só se torna possível aos seres humanos incorporando-se em um deles. Esse ser escolhido pelo orixá, um de seus descendentes, é chamado de elégùn, aquele que tem o privilégio de ser “montado”, gùn, por ele. Torna-se o veículo que permite ao orixá voltar à Terra para saudar e receber as provas de respeito de seus descendentes que o evocaram. Os elégùn muitas vezes são chamados iyawóòrìsà (iaô), mulher do orixá. Este termo tanto se aplica aos homens quanto às mulheres e não evoca uma ideia de união ou de posse carnal, mas a de sujeição e de dependência, como antigamente as mulheres o eram aos homens” (VERGER, 2002: 19).

A sujeição e dependência de Mestre Irineu – “mulher de orixá” – ao Poder feminino n’ O Cruzeiro é indiscutível, do início ao fim. Nanã/Ìyá Ìyá faz do Daime, certamente, uma doutrina ginecocrática (matrística), tomando emprestado o termo do filósofo Julius Evola, que defende tal concepção como “(…) Resíduos do ciclo da civilização “lunar”, em que se reflete o tema da passividade e da dependência do homem perante o Espírito concebido sob o aspecto feminino…” (EVOLA, 1978: 40). Isso posto, entendemos o porquê de a Mãe Divina com seus nomes  – mais de 200 citações em mais de 100 hinos – predominar amplamente n’O Cruzeiro em relação às citações “Pai” (62 vezes em 44 hinos)  e “Jesus” (52 vezes em 36 hinos). O que é realçado ao constatarmos que o nome “Pai” (“Papai”) só estreia no hino 6, Papai Paxá, e o de Jesus no hino 10, Eu Devo Pedi, considerando que o hino 05, Refeição, não é cantado no hinário. O divino feminino precede e tem proeminência destacada.

 

SOBRE ÌYÁMÌ (“MINHA MÃE’): O PODER ANCESTRAL FEMININO

Os elos entre o Daime – enquanto doutrina fundamentada pelo descendente de escravos Raimundo Irineu Serra – e a Religião dos Orixás vão surgindo à medida que desbravamos seu magnífico oráculo. A repetição exaustiva da expressão “minha mãe” (“nossa mãe” no hino 23) salta aos olhos: aparece 68 vezes em 46 hinos! Em português não traduz o alcance do que significa na cultura religiosa-social iorubá, que tem para a locução Ìyámì exatamente a tradução “minha mãe” ou “nossa mãe” e denota o poder ancestral feminino (PORTUGAL FILHO, 2022: 19-38); “A representação coletiva das mães ancestrais e o princípio feminino de onde tudo se origina” (RIBEIRO, 1996: 39). A autora sinonimiza Ìyámì a Ìyá Àgbà, que amplia o significado para “anciãs, pessoas de idade, mães idosas e respeitáveis” (p. 83-84). Por extensão, “Ìyá [mãe] mais antiga” (OYÈWÙMI, 2015: 63).  Ou ainda, Aiabá, que “(…) Em língua iorubá, quer dizer rainha” (MARTINS, 2008: 29). Justamente, entre as 68 citações da expressão “Minha Mãe”, na verdade um título (Ìyámì), indica-se em três oportunidades a Aiabá, Ìyá Àgbà: “A Rainha Minha Mãe/Que me mandou eu cantar/E ensinar os meus irmãos/Aqueles que procurar” (35: 4); “Minha Mãe Minha Rainha/Com amor ninguém não quis/Apanhar para obedecer/Na estrada para seguir” (55: 2). Nesse hino, define-se muito bem quem é essa “Ìyá mais antiga”: primeiro, no verso de caráter disciplinador “Apanhar para obedecer” – redizendo, Nanã é qualificada como “(…) Mãe justa, protetora, implacável e severa” (EGÍDIO, 2019: 13). Segundo, no verso contíguo “Na estrada para seguir”, que traz o axé de Obaluaiê, orixá inseparável de Nanã, “seu par natural na linha da evolução ou sabedoria”, pois enquanto ela disciplina, ele “(…) Desperta em cada um de nós a vontade irresistível de seguir adiante, de alcançar um nível de vida superior, para chegar mais perto de Deus” (EGÍDIO, 2019: 20; 36). Mas a pista final para sacramentar  Ìyá Ìyá/Nanã como essa “Mãe Rainha” está no hino Jardineiro: “Minha Mãe Minha Rainha/Foi ela que me entregou/Para mim ser jardineiro/No jardim de belas flores” (79, 1). Os versos trazem a lembrança do antiquíssimo culto de fertilidade: “(…)  No passado, em geral, os estudiosos se referiam ao culto da Deusa não como religião, mas como “culto de fertilidade”, sendo a Deusa uma “mãe terra”” (EISLER, 2007: 66). Uma referência são os mistérios de Eleusis na Grécia Antiga, ritos de iniciação ao culto das deusas agrícolas Deméter e Perséfone em que se usava uma bebida psicoativa chamada Kykeon (WASSON et al., 2013: 221). Precisamente, Cléo Martins associa Deméter a Nanã, “senhora da terra”, “senhora da fertilidade” ao citar Demeter “disfarçada na figura de uma anciã”, quando em busca de sua filha Perséfone, raptada por Hades (MARTINS, 2008: 60; 52-53).

 

SOBRE NÃO PROSELISMO E NÃO GANHAR DINHEIRO

Segundo o mito de fundação do Daime, na versão que o Orador de Mestre Irineu, Luiz Mendes do Nascimento, relatou-me, a “Rainha” foi bem clara quanto a dois preceitos fundamentais: não convidar e não ganhar dinheiro. Esses são dois elos éticos entre o candomblé e a doutrina de Juramidã, que envolvem diretamente a Ìyá (Mãe). “A religião dos orixás não é proselitista. Para que alguém se torne sacerdote ou sacerdotisa de um determinado orixá é preciso, antes de tudo, que a divindade tome a iniciativa da escolha, chamando o neófito ao sacerdócio” (MARTINS, 2008: 35). Pierre Verger, testemunhando a iniciação de um futuro elégùn de Xangô na África, anota: “Ìyá Sàngó pergunta-lhe: “Procuras o poder do orixá ou dinheiro?” O candidato responde: “É o poder do orixá que eu quero”” (VERGER, 2002: 41).

Quem traz o poder do orixá é uma mulher. Não só no caso das Ìyá de Xangô, mas nas de outros orixás, como Obaluaiê: “O axé de Obaluaê é trazido por uma mulher em transe que caminha com passos incertos, seguida por aquelas que levam as gamelas com alimentos” (VERGER, 2002: 214). Não é demais lembrar que, em sua iniciação na floresta, Irineu recebe o axé (poder) – segundo algumas versões – de uma “mulher” chamada Clara (MOREIRA & MACRAE, 211: 94). E não é porque se chamava Clara, que deva ser imaginada e representada nas artes daimistas como uma mulher branca, seguindo o modelo de branqueamento de Iemanjá, por exemplo.

 

SOBRE OS VERSOS SAGRADOS

Como na doutrina daimista, a Religião dos Orixás tem seu oráculo composto por versos. Trata-se dos Poemas Sagrados ou Versos Sagrados de Ifá, “(…) A base matricial de todo o complexo conhecimento iorubá. Eles dão a liga que une a transmissão dos conhecimentos da oralidade sagrada de uma geração à outra. (…) Os portadores desses conhecimentos ancestrais são condutores da palavra sagrada dada pelo ser supremo. A palavra possui uma força vital” (XAVIER, 2010: 208; 217). Assim sendo, em seu poema esotérico, Mestre Irineu proclama o caráter divino de seu verbo: “As palavras que eu disser/Aqui perante a este poder/Estão escritas no astral/Para todo mundo ver” (78: 4); ratificando no hino 89: 1: “Eu canto eu digo/Dentro do poder divino/Porque Deus é quem me dá/Para trazer estes ensinos”. O verbo “cantar”, que aparece n’O Cruzeiro em 27 hinos sendo repetido 46 vezes, é a chave do axé da Palavra – poder de realização. Uma afinidade importante em relação à sagrada hinologia primordial do Daime e às escrituras dos orixás são os inúmeros versos dedicados as Ìyámi (sem “s”), as Mães Ancestrais, o imemorial poder da fêmea – Ìyá Mapo, “Mãe da Vagina” (AUGRAS, 2000: 19).  O babalaô Fernandez Portugal Filho cita 1993 versos, no subtítulo Versos de Ifá Que Trazem O Culto Às Mães Ancestrais (PORTUGAL FILHO, 2022: 45-193).

NOTA: “poder ancestral feminino” refere-se à fêmea mesmo e não à feminilidade, que, na acepção “caráter da mulher”, foi definido socialmente pelo patriarcado para servir como um mecanismo de controle sobre àquela que deve se comportar como “sensível, emotiva, doce, acolhedora e passiva”. Leoas rugem e caçam e não deixam de ser leoas.

 

SOBRE A DANÇA (O BAILE)

O Baile foi introduzido no Daime em 1938. Igualmente fundamental no Candomblé é a “Dança dos Orixás”, termo usado por Cléo Martins. Segundo a ialorixá, “Na tradição dos orixás (também dos voduns [deuses jejes] e inquices [deuses bantos]), a parte da liturgia que compreende as danças – tanto do xirê [roda], como da divindade manifestada em seus sacerdotes e sacerdotisas  – é de grande relevância para a comunidade religiosa. (…) Contudo, o iniciado deverá esforçar-se por dançar com dignidade, de forma sóbria e religiosa, sem grandes exageros. (…) No candomblé a dança é uma forma peculiar de comunicação e veículo do sagrado, porque tudo é dança. A divindade celebra dançando, abençoa seus filhos dançando, corrige-os de alguma falta dançando” (MARTINS, 2008: 38-39).

NOTA 01: o baile primordial fundamentado por Mestre Irineu, que pode ser apreciado até os dias atuais no CICLU-ALTO SANTO, traz claramente a influência de Nanã, a Orixá da calma absoluta (EGÍDIO, 2019: 123). Ou seja, o ritmo do baile não é arrastado e nem avexado (frenético). Tranquilo como pede a força de um Daime clássico (“Primeiro Grau”). Inclusive, a calma típica de Nanã tomava parte na personalidade de seu filho Irineu, segundo relatou-me Percília Matos: “Era muito humilde, ele…aquilo era lento…em tudo, por tudo. Tudo dele era com calma, com prudência” (MAIA NETO, 2003: 43).

NOTA 02: Existe uma marcante diferença litúrgica entre o candomblé e o Daime (linha tradicional), o que inclui a questão da incorporação como imaginada usualmente. Deixo a cargo do condiscípulo Paulo Moreira, a elucidação: “Esta observação é pertinente à discussão sobre o pouco espaço existente na doutrina original de Mestre Irineu para os transes de incorporação, apesar de sua frequência nas manifestações afro-maranhenses pelas quais foi tão influenciada. O que encontramos no Daime é a “irradiação”, termo empregado para certo tipo de transe em que o sujeito não perde completamente a sua noção de si ou a memória do ocorrido durante sua vigência” (MOREIRA & MACRAE, 2011: 273).

 

SOBRE A DIETA SEXUAL

Um dos preceitos modelo e dos mais importantes instituído por Mestre Irineu é a abstinência sexual três dias antes e três depois de se tomar o Daime, regra que está eternizada no hino 104, Sexta-Feira Santa, sendo extensiva a todo calendário litúrgico. Pierre Verger descobriu, justamente, entre devotos de Nanã na África, durante uma peregrinação iniciática, a obrigatoriedade de “(…) Abster-se de ter relações sexuais. Durante esse período, devem suportar certas provações para demonstrar que são dignos…” (VERGER, 2002: 237). Outro relato sobre o jejum sexual, veremos no próximo subtítulo.

 

SOBRE ECOLOGIA E O REINO VEGETAL:

“A religião dos orixás é ecológica por excelência, profundamente voltada para a natureza…” (MARTINS: 2008: 29). O orixá Ossain, filho de Nanã  “(…) É a divindade das plantas medicinais e litúrgicas. A sua importância é fundamental, pois nenhuma cerimônia pode ser feita sem a sua presença, sendo ele o detentor do axé (o poder), imprescindível até mesmo aos próprios deuses. O nome das plantas, a sua utilização e as palavras, cuja força desperta seus poderes, são os elementos mais secretos do ritual do culto aos deuses iorubás” (VERGER, 2002: 122). Os sacerdotes de Ossain são considerados “(…) Curandeiros, em virtude de suas atividades no domínio das plantas medicinais. Quando eles vão colher as plantas para os seus trabalhos, devem fazê-lo em estado de pureza, abstendo-se de relações sexuais na noite precedente, e indo à floresta, durante a madrugada, sem dirigir palavra a ninguém” (p. 122-123). Lembro-me de Luiz Mendes do Nascimento contando sobre as curas que Mestre Irineu fazia receitando as garrafadas que ele mesmo preparava. No retrato pintado por Jairo Carioca, no tocante ao período iniciático de Irineu nas matas: “Já adaptado na região, alinhava-se as leis da natureza, os segredos e as utilidades das plantas, seus efeitos curativos…” (CARIOCA, 2000: 30).

 

AS FORÇAS DOS ORIXÁS N’O CRUZEIRO – UM COMENTÁRIO.

 

A FORÇA DE OBATALÁ (OXALÁ)

Hino 26, Leão Branco: Obatalá significa “Rei (Obà) do Pano Branco (àlà)”, etimologia descrita por Pierre Verger, que o classifica como o “(…) Mais elevado dos deuses iorubás” (VERGER, 2002: 252).

NOTA: tradicionalmente, há uma ligação do Leão ao orixá Xangô; entretanto, Mestre Irineu adjetiva o leão com a palavra “branco”, configurando ao meu ver uma opção interpretativa que se ajusta ao hino 26.

 

A FORÇA DE OBALUAIÊ (OMOLU/XAPANÃ)

Atotô! Calma, leitor, para percebê-lo no hino Papai Paxá: “Quando Papai Paxá/Barum, marum, mais eu/Saudade saudade/Saudade de mamãe” (6:2) – Obaluaiê, o arquétipo do “filho abandonado” (segundo o mito iorubá) de Nanã, na mística, enigmática e genial equação que Mestre Irineu nos traz. Na tradução de Pedro Ratis e Silva: “Da união de Obatalá (água da chuva, princípio gerador masculino) com Nanã (princípio feminino em seu aspecto maternal ctônico), nasce Obaluaiê, rei dos espíritos do aiê. Seu grande corpo negro cheio de feridas é o testemunho de suas origens, ao mesmo tempo celestes – o céu estrelado de seu pai – e terrenas: a lama preta de sua mãe” (SILVA, 2000: 79). “Barum”, o barro de Nanã; “marum, o mar sagrado pelo Espírito  –  vento, sopro de Deus – animado (Gn 1: 2); “Mais eu”, o filho reencontrado e reconectado no Self! Conclui o terapeuta junguiano: “Imagem arquetípica do divino no humano, do espírito [“marum”] na matéria [“barum”], Obatalá + Nanã, Obaluaiê é uma imagem do arquétipo do espírito humano” (SILVA, 2000: 79).

Esse modelo de realização-manifestação, da transcendência de marum na imanência de barum está muito bem codificado no Hino 11 (Um e Um), Unaqui (Um aqui): “Eu estou aqui/Foi Deus do céu quem me mandou/Sou filho da Virgem Mãe/Lá no céu Jesus Cristo salvador” (11, 1). O “Rei do Aiê”, o  Filho da Terra (Mãe) unificado a Obatalá (Oxalá) reconhece o Soberano (“Paxá”, Olorum). Noventa e quatro hinos depois, para constar e ratificar: “Sou filho deste poder/E vivo na terra (barum) e no mar (marum) /Implorando a meu Pai eterno/nas alturas onde ele está” (Hino 105, 1, Sou Filho deste Poder). Por fim, no hino De longe, outra vez e de forma explícita, “marum” é situado como a morada do Ser, encarnado no barro do aiê para este mistério conhecer: “De longe, eu venho de longe/Das ondas do mar sagrado/Para eu conhecer o poder/Das florestas e Deus amar” (110: 1). Remetendo ao Éden bíblico, sacramento a exegese dos dois primeiros versos: “(…) Um sopro de Deus agitava a superfície das águas” (Gn: 1: 2).

A “saudade de mamãe” (hino 06) em meio às vicissitudes do abandono, abriu em “Omolu” as chagas emocionais, à flor da pele: “(…) Órgão de relação, funciona como fronteira entre o mundo interno e o mundo externo. (…) A necessidade de a pele ser ferida é a necessidade da abertura entre esses dois mundos e, por extensão, entre o “eu’ e o “não-eu”, entre o que está na consciência e o que está no além (além-consciência): entre o eu e o outro. A ferida na pele surge então como uma abertura maior para o outro…” (SILVA, 2000: 173). Quem se feriu e se curou pode curar, no axé de Obaluaiê, “Orixá das doenças, médico dos pobres…“ (SILVA, 2000: 171): “Fazendo algumas curas/Que minha mãe me ordenou/De brilhantes pedras finas/Para sempre aqui estou” (114, 4). Limpado e harmonizando os corpos, do denso ao sutil, e lapidando a pedra filosofal – Consciência divinal!

NOTA: o leque exegético da expressão mística “Barum, marum mais eu” está disponível na interpretação do hino 6, “Papai Paxá”. Digite “Papai Paxá” em pesquisar ou acesse (clicando) no subtítulo “Links”, situado ao final deste texto.

 

A FORÇA DE XANGÔ

No hino da balança, Eu Balanço: ‘’E eu Balanço e eu balanço/E eu balanço tudo enquanto há…” (46: 1,2,3,4): “Xangô é viril e atrevido, violento e justiceiro; castiga os mentirosos, os ladrões e os malfeitores” (VERGER, 2022: 141; 135). De modo que, igualmente, podemos identificá-lo no hino Linha do Tucum: “Esta é a linha do Tucum/Que traz toda lealdade/Castigando os mentirosos/Aqui dentro desta verdade” (108: 4).

 

A FORÇA DE IEMANJÁ

Hino A Virgem Mãe Que Me Ensinou: “A Virgem Mãe é soberana/Ela é Rainha do Mar/Quando vê nós na aflição/Ela vem nos consolar” (44: 4) – “No Brasil, Iemanjá é sincretizada com Nossa Senhora da Imaculada Conceição, festejada no dia 8 de dezembro…”; “Seus adeptos tomaram Iemanjá como a personificação do bem e da maternidade austera e protetora” (VERGER, 2002: 192-193). Também faz uma participação especial no hino Eu Balanço: “Eu chamo o vento, chamo a terra e chamo o mar/Para todos vir me acompanhar” (46:2).

 

A FORÇA DE OIÁ-IANSÃ

“A divindade dos ventos, das tempestades e do rio Niger que, em iorubá, chama-se Odò Oya. Foi a primeira mulher de Xangô e tinha um temperamento ardente e impetuoso” (VERGER, 2002: 168). Justamente, por ser companheira de Xangô, dá o ar de sua graça no hino Eu Balanço: “Eu chamo o vento, chamo a terra e chamo o mar/Para todos [as] vir me acompanhar” (46, 2) – Iansã, Nanã e Iemanjá, três Ìyámì, Mães-Rainhas iorubás, “(…) Que representam aspectos coletivos do poder ancestral feminino…” (RIBEIRO, 1996: 81). Esses poderes debutam no primeiro versículo no hino que abre O Cruzeiro: “Sol, Lua, estrela/A terra, o vento e o mar…” (29: 1)! O axé de Oiá está na “força” –  reiterando, palavra que aparece n’O Cruzeiro em 17 hinos sendo repetida 37 vezes. Lucas figura a presença da orixá: “De repente, veio do céu um ruído como o agitar-se de um vendaval impetuoso…e todos ficaram repletos do Espírito Santo…” (Atos, 2-4). “O nome latino animus, espírito, e anima, alma, tem o mesmo significado do grego anemos, vento. A outra palavra grega que designa o vento, pneuma, significa também espírito” (JUNG, 1984: 290). Acrescentando: “Tanto na língua grega quanto nos idiomas hebraico/aramaico uma única palavra é utilizada para designar dois elementos: espírito e vento (sopro)” (NOVO TESTAMENTO, 2010:401). Em síntese, o “sopro” e o “vento” são sinônimos do Espírito Santo, a força que gera, domínio das Ìyá.

 

A FORÇA DE OXUM

Ao mencionar as forças de Nanã, Iansã e Iemanjá no hino 46, Eu Balanço, cuja regência é de Xangô, não se omite a presença de Oxum: “Chamo o cipó, chamo a folha e chamo a água/Para unir e vir me amostrar” (46, 3). É quem consolará e aliviará a sede de saber de Tuperci no caminho iniciático, após a chamada de atenção de Ìyá ìyá/Nanã em Ripi, hino 3 – trata-se de Formosa, hino 4, Oxum/Tarumim: “(…) É a rainha de todos os rios e exerce seu poder sobre a água doce, sem a qual a vida na terra seria impossível” (VERGER, 2002: 174). “Formosa, formosa, formosa é bem formosa…” (04: 1) – “Mulher elegante que tem joias de cobre maciço. (…) Oxum limpa suas joias de cobre antes de limpar seus filhos” (p. 174). Benevolência, formosura e sabedoria.

 

A FORÇA DE OBÁ

Se homenageei Iansã e Oxum, urge fazê-lo com Obá,  pois não quero correr o risco de levar uma lapada da orixá de espada. Tal como as duas primeiras, também é companheira de Xangô e um tanto ciumenta! Brincadeira à parte, “O arquétipo de Obá é o das mulheres valorosas e incompreendidas. Suas tendências um pouco viris fazem-nas frequentemente voltar-se para o feminismo ativo” (VERGER, 2022: 187). No hino Eu Peço A Jesus Cristo, após exultar as companheiras da Velha Rainha (64, 7), recoloca a Deusa Tripla do Neolítico – subjugada pelo patriarcalismo – em seu devido lugar e porque não dizer com o axé de Obá: “A Lua tem três passagens/Todas três nela se encerra/é preciso compreender/Que ela é quem domina a Terra” (64, 9).

 

A FORÇA DE OGUM

Traz o arquétipo das pessoas “(…) Que perseguem energicamente seus objetivos e não se desencorajam facilmente. Daquelas que nos momentos difíceis triunfam onde qualquer outro teria abandonado o combate e perdido toda a esperança” (VERGER, 2002: 95). Na força de Ogum: “Entrei numa batalha/Vi meu povo esmorecer/Temos que vencer/Com o poder do senhor Deus” (hino Batalha, 115: 1).

NOTA: esse hino deve ser repetido três vezes no hinário.

 

A FORÇA DE OXÓSSI

Tendo seu mito ligado às florestas, “Oxóssi, o deus dos caçadores…torna suas expedições eficazes, delas resultando caça abundante” (VERGER, 2002: 112-113)“Eu sou filho da terra/Vivo nas matas sombrias/Implorando ao Pai eterno e à sempre Virgem Maria/Aqui eu toco meu tambor/E nas matas eu rufo caixa/Todo mundo vai atrás/Procurando mais não acha” (hino 100, 1-2, Eu Sou Filho da Terra). O elemento do Orixá das Matas é terra (BARCELLOS, 2010: 20). Segundo o médium e teólogo de umbanda Rubens Saraceni, Oxóssi traz o fator expansor da “onda geradora vegetal”, regendo sobre o conhecimento: “O fator expansor atua sobre o raciocínio dos seres… aumentando a sua capacidade de apreensão e aprendizado” (SARACENI, 2021: 94,97). Estando nas matas com Oxóssi, quem procura (se) acha. A xarada proposta pelo hino 100: 1-2 é resolvida no belo hinário Alvorada, da senhora Ana de Sousa, sogra de Luiz Mendes do Nascimento: “Eu sigo, eu sigo, eu sigo/Os meus passos na floresta/Fui no pé de Jagube/Para apresentar meu Mestre/Cheguei lá eu encontrei/O meu Mestre recostado/Ele disse para mim/A tua riqueza encontraste” (9: 1-2). “Vó Ana”, como é carinhosamente chamada e que “mais rezava do que falava”, nas palavras de seu neto Saturnino Brito do Nascimento, teve o privilégio de apresentar seus hinos a Mestre Irineu. Link (clique) para o áudio do hino de Ana de Sousa: https://nossairmandade.com/hymn/2577/EuSigo

NOTA: no hino 100, “tambor” não se refere ao instrumento, pois Mestre Irineu não tocava tambor na sede de trabalhos, embora, segundo minha dileta amiga e informante Nazaré Granjeiro, revelando lembranças de sua mãe Adália Gomes, filha do patriarca Antônio Gomes da Silva: “Eu ouvi uma vez a mamãe contar que o Mestre tinha sim tambor. Só não tocava na sede porque não tinha quem tocasse. Vivia no paiol”. O tambor, no candomblé, é um instrumento de poder fundamental, inclusive com tambores específicos para diferentes orixás (VERGER, 2002: 70, 72, 103, 255). O tambor exige alguém absolutamente treinado para o ofício! Como o Mestre não encontrou tal pessoa, o instrumento não foi introduzido na sede. Um outro entendimento que surgiu quando estive visitando o Tambor de Mina (Casa Das Minas) no Maranhão em 2005, carinhosamente recebido pela Vodunsi Deni Prata (foto), hoje no Orum, intui que Mestre Irineu pode ter usado a palavra “tambor” – jargão do “candomblé maranhense”  – para designar seu próprio culto, o Tambor de Daime! Seria mais um elo sutil com a religiosidade de seus ancestrais.

Porém, em relação ao contexto histórico primordial do hino, “Aqui eu toco meu tambor…” é a voz do “Rei Jagube”. Convido o leitor a apreciar a história, que envolve Mestre Irineu, Francisco Granjeiro e Júlio Carioca. Crédito e agradecimento ao seu filho e amigo Guido Carioca, que repassou a versão contada por seu pai. Guido, através do casamento com Nazaré Granjeiro, uniu as tradicionais famílias daimistas “Os Cariocas” e “Os Granjeiros”, simbolizando a grande e amorosa amizade entre Francisco Granjeiro e Júlio Carioca. (vide “Links” ao final do texto)

 

A FORÇA DE OSSAIN

Oxóssi chama Ossain, pois o Rei das Matas “(…) Havia encontrado Ossain e este lhe dera para beber uma poção onde foram maceradas certas folhas, como a amúnimúyè, cujo nome significa “apossa-se de uma pessoa e de sua inteligência”, o que provocou em Oxóssi uma amnésia. (…) Ficou, então, vivendo na mata com Ossain” (VERGER, 2002: 113). Justamente, “Ossain é a divindade das plantas medicinais e litúrgicas” (p. 122): “Chamo o cipó, chamo a folha e chamo a água/Para unir e vir me amostrar” (Hino 46, 3, Eu Balanço). Ossain, filho de Ìyá Ìyá/Nanã, a “proprietária do pássaro-poder”, também se manifesta  no hino 69, Passarinho: “O pássaro é a representação de poder de Ossain. É o seu mensageiro que vai a toda parte…” (VERGER, 2002: 122).

 

A FORÇA DE ORUNMILÁ

Ossain chama Orunmilá, pois “(…) Se é Ossain que conhece o uso medicinal das plantas, é, entretanto, a Orunmilá que cabe o mérito de haver conferido nomes a essas mesmas plantas. Os poderes de cada planta estão em estreita ligação com seu nome e são despertados por palavras obrigatoriamente pronunciadas no momento de seu uso” (VERGER, 2002: 123). O babalaô (“pai do segredo”)  Irineu ativa o axé na chamada “Chamo o cipó, chamo a folha e chamo a água/Para unir e vir me amostrar” (Hino 46, 3, Eu Balanço). E Junto a Oxóssi,  evoca Orunmilá no hino A Virgem Mãe É Soberana: “Eu estava dentro da mata/Debaixo de um arvoredo/Tudo tem, tudo tem/E no mundo não há segredo” (76: 4). Orunmilá, divindade da sabedoria que tem no babalaô seu sacerdote, recebe o título de “Chefe Conselheiro” (VERGER, 2002: 126). Isso posto, “Sou filho desta verdade/E neste mundo estou aqui/Dou conselho e dou conselho/Para aqueles que me ouvir” (Hino 102, 1, Sou Filho Desta Verdade).

 

A FORÇA DE OXUMARÉ

“Diz-se que ele é um servidor de Xangô…Oxumaré é mobilidade e atividade. Uma de suas obrigações é a de dirigir as forças que produzem o movimento” (VERGER, 2002: 206). Serviçal de Xangô e movimento nos levam novamente ao hino 46, Eu Balanço. Quanto axé agregado tem esse hino: Xangô, Nanã, Iansã, Iemanjá, Oxum, Ossain, Orunmilá e, agora, Oxumaré! Em que parte do hino, especificamente, está a presença desse que é o filho andrógino de Nanã?  “E eu balanço e eu balanço/E eu balanço tudo enquanto há/Tenho prazer, tenho força e tenho tudo/Porque Deus eterno é quem me dá” (46: 4). “Tenho prazer, tenho força e tenho tudo”: “Oxumaré reside no céu e só de tempos em tempos tem autorização de pisar na terra. Nessas ocasiões [invocações], os seres humanos tornam-se ricos e felizes” (VERGER, 2002: 206); “Porque Deus eterno é quem me dá”: Oxumaré “(…) É o símbolo da continuidade e da permanência e, algumas vezes, é representado por uma serpente que se enrosca e morde a própria calda. Enrola-se em volta da terra para impedi-la de se desagregar. Se perdesse as forças, isso seria o fim do mundo…” (VERGER, 2002: 206). Oxumaré também irradiará seu axé no hino Eu Canto Nas Alturas: “Com amor tudo é verdade/Com amor tudo é certeza/Eu vivo neste mundo/Sou dono da riqueza” (40, 3); e no hino Laranjeira: “Vou vivendo e vou dizendo/De acordo o que vai chegar/O ouro que tem na terra/É a luz que brilha mais” (60, 4), pois “Oxumaré é o senhor da riqueza e da fartura; o dono do ouro” (MARTINS, 2008: 108).

 

A FORÇA DE EXU

Como Orixá “(…) Serve de intermediário entre os homens e os deuses” (VERGER, 2002: 76): “Te levanta te levanta/Levanta quem está sentado/Para receber o mensageiro/Dentro do jardim dourado” (Hino 95, 1, Mensageiro). Exu é o “(…) Nome dado pelos nagô [iorubás] ao aspecto dinâmico do existir…” (SILVA, 2000: 170): “Vai seguindo, vai seguindo/Dentro do jardim do amor/Para receber o mensageiro/Do nosso Pai criador” (95: 2); “Para receber…”: Exu é “(…) Aquele que dá passagem…” (BARCELLOS, 2010: 13); “A mensagem que ele traz/É com prazer e alegria/Jesus Cristo e São José/E a sempre Virgem Maria” (95: 3): o Filho, a personificação do Pai (José) e a Mãe, pois Exu “É o princípio natural de tudo; é o início, o ponto de partida, o nascimento, a força de criação” (BARCELLOS, 2010: 13).

 

AGRADECIMENTO A PAPAI VELHO E MAMÃE VELHA

Agradeço a todos os orixás, forças divinas, sobretudo a minha mãe Nanã e meu pai Obatalá, que me honraram com uma visita em uma madrugada no início de outubro de 2022, em sonho pós-Daime, quando eu iniciava meu processo de conexão para escrever o texto. Ela estava toda de branco, incluindo um turbante majestoso. Trazia uma pilha de livros em que constava o clássico de Pierre Verger (Orixás), inclusive soletrando o nome do autor. Estávamos em uma sala anexa ao salão de trabalhos. Após dar o recado e um dulcíssimo sorriso, pegou-me pelo braço e se dirigiu a porta de entrada do estabelecimento atravessando o salão. Para minha surpresa, havia um cruzeiro de dois braços fincado em um belíssimo jardim, primorosamente cuidado. Em verdade, só aí percebi que estava em um centro do Daime no astral – existem vários onde tomamos a sagrada bebida normalmente. Ainda na escadinha da entrada, olhei à direita e lá estava com um sorriso magnifico meu Papai. Salve Oxalá! Salve Nanã! Salve Obaluaiê! Salve os orixás!

 

FOTO INICIAL: Ìyá ìyá (Vó) Cota, Maria Mattos, irmã de Mestre Irineu. Vó Cota recebeu o hino “Meu Navio Azul”, que fecha o hinário Os Chamados do CEFLI.

 

Foto de Vó Cota gentilmente cedida por Rosalange Nascimento, querida “Rosa”, filha do padrinho Luiz Mendes e da madrinha Rizelda Brito.

 

LINKS (Clique):

Para Tuperci:

https://evangelhodejuramida.com.br/hino-02-tuperci/

Para Papai Paxá:

https://evangelhodejuramida.com.br/hino-6-papai-paxa/

Para o hino 100 (história do tambor):

https://evangelhodejuramida.com.br/category/historia-dos-hinos/

 

REFERÊNCIAS:

AUGRAS, Monique. De Ìyámì a Pomba-Gira: Transformações e Símbolos da Libido. In: MARCONDES DE MOURA, Carlos Eugênio (org.). Candomblé, Religião do Corpo e Da Alma: tipos psicológicos nas religiões afro-brasileiras. Rio de Janeiro: Pallas, 2000;

BARCELLOS, Mario Cesar. Os Orixás e A Personalidade Humana. 5ª ed. Rio de Janeiro: Pallas, 2010;

BATISMO. In: DICIO, Houaiss Eletrônico. São Paulo: Objetiva, 2009;

BAYER NETO, Eduardo. Século XIX: No Maranhão, a Aurora da Vida do Mestre. Jornal O Rio Branco, Rio Branco, AC, p. 3, 15 de dezembro de 1992. Suplemento Especial O Centenário de Juramidam;

BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém: Nova Edição, Revista e Ampliada. São Paulo: Paulus, 2002;

CARIOCA, Jairo. Doutrina do Santo Daime: A Filosofia do Século. Monografia. Rio Branco, 2000;

CHAUÍ, Marilena. Introdução à História da Filosofia dos Pré-Socráticos a Aristóteles. São Paulo: Brasiliense, 1994, v. I;

EGÍDIO, Cris; VIERA, Lourdes de Campos. Nanã Buruquê: a guardiã do saber ancestral. São Paulo: Madras, 2019;

EISLER, Riane. O Cálice e A Espada: nosso passado e nosso futuro. São Paulo: Palas Atenas, 2007;

ESCHENBACH, Wolfram von. Parsifal. 4ª ed. São Paulo: Antroposófica, 2015;

EVOLA, Julius. O Mistério do Graal. Lisboa: Veja, 1978;

GONZÁLEZ-WIPPLER, Migene. Jesus e a Cabala Mística: Chaves para o Reino. São Paulo: Pensamento, 2006;

IAIÁ. In: DICIO, Houaiss Eletrônico. São Paulo: Objetiva, 2009;

JUNG, Carl Gustav. A Natureza da Psique. Petrópolis (RJ): Vozes, 1984;

JUNG, Emma; FRANZ, Marie-Louise Von. A Lenda do Graal Do Ponto de Vista Psicológico. São Paulo: Cultrix, 1980;

MAIA NETO, Florestan Japiassú. Contos da Lua Branca. Rio Branco (AC): Fundação Elias Mansour, 2003;

MARTINS, Cléo. Nanã: a senhora dos primórdios. Rio de Janeiro: Pallas, 2008;

MEIER, John P. Um Judeu Marginal: Repensando o Jesus Histórico. 3ª ed. Rio de Janeiro: Imago, 1992.

MOREIRA, Paulo; MACRAE, Edward. Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e seus companheiros. Salvador: EDUFBA, 2011;

NOVO TESTAMENTO/tradutor Haroldo Dutra Dias; revisor Cléber Varandas de Lima.  Brasília (DF), Brasil: Conselho Espírita Internacional, 2010.

OYÈWÙMI, Oyèrónké. What Gender is Motherhood? Changing Yorùbá Ideals of Power, Procreation And Identity In The Age Of Modernity. New York: Palgrave Macmillan, 2015;

PAULO, Margarida Nichele. Indagação Sobre a Imortalidade da Alma em Platão. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1996;

PINTO, Gracilene. São Vicente Férrer: História, Povo e Cultura. Monografia. São Luis: [s. n.], 2001;

PORTUGAL FILHO, Fernandez. Ìyámì Oxorongá: o culto as Mães Ancestrais. São Paulo: Arole Cultural, 2022;

RIBEIRO, Ronilda Iyakemi. Alma Africana no Brasil: Os Iorubás. São Paulo: Editora Oduduwa, 1996;

SARACENI, Rubens. Orixás Ancestrais: a hereditariedade divina dos seres: compêndio teológico de umbanda sagrada. 8ª ed. São Paulo: Madras, 2021;

SILVA, Pedro Ratis. Exu/Obaluaiê e O Arquétipo Do Médico Ferido Na Transferência. In: MARCONDES DE MOURA, Carlos Eugênio (org.). Candomblé, Religião do Corpo e Da Alma: tipos psicológicos nas religiões afro-brasileiras. Rio de Janeiro: Pallas, 2000;

SILVEIRA BUENO, Francisco da. Vocabulário Tupi-Guarani Português. 3ª ed. São Paulo: Brasilivros Editora, 1984;

STARBIRD, Margaret. Maria Madalena e o Santo Graal: A Mulher do Vaso de Alabastro.  3ª Ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004;

VASCONCELOS, Sérgio Sezino Douets. Tópicos Sobre O Papel Da Igreja Em Relação À Escravidão E Religião Negra No Brasil. Revista de Teologia e Ciências da Religião da UNICAP (Universidade Católica de Pernambuco). Recife, v. 4, n. 4, p. 35-51, set. 2005;

VERGER, Pierre Fatumbi. Orixás: deuses iorubás na África e no Novo Mundo. 6ª ed. Salvador: Corrupio, 2002;

WASSON, Robert Gordon; HOFMANN, Albert; RUCK, Carl A. P. El Camino a Eleusis: Una  Solución al Enigma de los Misterios. 2ª Ed. México: FCE, 2013;

WELBURN, Andrew. As Origens do Cristianismo. São Paulo: Best Seller, 1991;

XAVIER, Juarez Tadeu de Paula. As Teias Entrelaçadas Pela Oralidade Africana. In: INCONTRI, Dora (org.). Educação e Espiritualidade: interfaces e perspectivas. Bragança Paulista, SP: Editora Comenius, 2010.

Respostas de 6

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *