Histórias dos Hinos d’O Cruzeiro

Facebook
Twitter
WhatsApp

INTRODUÇÃO

As histórias de alguns hinos d’O Cruzeiro publicadas a seguir, são retiradas de um trabalho de minha autoria conhecido por Contos da Lua Branca (Rio Branco, AC: Fundação Elias Mansour, 2003). Esse modesto e amador livrinho faz parte da literatura daimista dedicada à vida e obra de Raimundo Irineu Serra. Foi precedida pelo pioneirismo de Sebastião Jaccoud e seu Terceiro Testamento: Um Fato Para A História (1992), seguido da monografia de Jairo Carioca, Doutrina do Santo Daime: A Filosofia do Século (2000). Entretanto, essas relíquias tiveram suas divulgações praticamente restritas a Rio Branco, capital do Acre. A proposta do Contos da Lua Branca foi a divulgação em nível nacional de algumas histórias abordando os hinos de Mestre Irineu, bem como um resumo biográfico no último capítulo. Esta edição do site está atualizada com novas histórias sobre os hinos, que não tomaram parte no livro, lançado em 2003. São frutos de relatos posteriores, colhidos por mim, pelo condiscípulo Paulo Moreira, reveladas em seu tratado biográfico Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e Seus Companheiros (EDUFBA, 2011), e por Jairo Carioca em seu livro Vovô Irineu (Editora Cristo Consolador, 2023).

 

HINO 01 – LUA BRANCA

“No início não existia hino, o que existia eram chamados, assim mesmo solfejados ou assobiados. Quando foi um dia, a Virgem Mãe disse para ele: – Eu vou te ensinar uns hinos, para tu também ensinar aos teus, para não cantarem essas coisas do mundo. Em vez de cantarem essas coisas do mundo que não tem valor, cantem os hinos que eu vou te ensinar. Aí, ele disse: – E é?! Ela falou: -É. E tem que começar por ti, tu vais aprender. Ele perguntou: – Mas como minha mãe se eu nunca cantei nada em minha vida? Ela respondeu: – Mas eu te ensino! Ele insistiu em dizer que não era possível porque ele nunca tinha cantado e coisa e tal… Ela falou para ele não se preocupar, que ela ensinava. E dentro daquela insistência toda, tanto de um lado quanto de outro, ela foi e disse: – Abre a boca e diz alguma coisa! Aí, quando ele abriu já foi cantando Lua Branca! O primeiro hino. Ele estava contemplando a Lua. Era uma noite de lua clara. Depois ele pediu a Rainha que concedesse um espaço para que os irmãos também passassem a receber hinos. Foi quando começou: Germano, Antônio Gomes, João Pereira, Maria Damião, e aí foi juntando” (Depoimento de Luiz Mendes do Nascimento a Florestan Neto, Rio Branco, 2000).

“Quando eu cheguei nesta casa junto com meus pais, em 1935, só existia Lua Branca. O Mestre falava que havia recebido esse hino lá no Peru. Daí por diante, eu era criança nessa época, tive uma ideia… Deus me deu o dom de prestar atenção em quantos hinos que ainda iam sair dali por diante. Logo veio Tuperci, depois o Ripi e eu fui marcando…” (Depoimento de Percília Matos da Silva – zeladora d’O Cruzeiro – a Florestan Neto, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-01-lua-branca/

 

HINO 02 – TUPERCI

“Uns são caboclos e outros somos nós mesmos, né? Porque cada um de nós que chega nesta casa… É como diz o hino: “Tuperci não me conhece/Tu não sabes me apreciar/Tu não sabes me compreender/A minha flor cor de Jaci”. Tem uma plantinha aí [palmeira Jaci], que justamente ele diz que essa plantinha é referente a esse hino” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-02-tuperci/

 

HINO 03 – RIPI

“Ripi, Ripi, Ripi/Ripi, Ripi, Iaiá.. E são línguas diferentes, linguagens diferentes. “Se você não queria/Para que veio me enganar?” Por exemplo, chega um irmão, participa e depois não procura aprender e fica até atrapalhando os outros. Em vez de seguir direitinho, prestar atenção aos ensinos, não faz isso” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-03-ripi/

 

HINO 04 – FORMOSA

“Essa Mãe D’Água, pode estar o maior verão, se o senhor cantar três vezes seguidas num dia esse hino, pode fazer chover. Já aconteceu com meu cunhado. Ele morava na colônia e diz ele que estava uma sequidão medonha. Aí, ele disse: – Eu vou chamar a Tarumim. Aí, ele cantou o hino três vezes. Resultado: deu um temporal que vinha derrubando tudo, destelhou até casa. Aí, ele falou que nunca mais ia fazer isso” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-4-formosa/

 

HINO 05 – REFEIÇÃO

“Refeição é um hino que não é da linha [não se canta no hinário]. É um hino só de agradecimento a Deus pelo que se recebe. Olha, antes da refeição, a gente canta de uma forma: “É quem dá o nosso pão”. Depois da refeição, a gente diz: “´Foi quem deu o nosso pão”. Antes, é “quem dá”. Depois, “foi quem deu”. É assim. O Mestre recomendava que todo mundo cantasse esse hino na hora da refeição” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-4-formosa/

 

HINO 06 – PAPAI PAXÁ

“Equiôr, equiôr quer dizer: eu estou. Tanto faz dizer “eu estou” como “equiôr”. É uma interpretação de linguagem. “Equiôr, equiôr, equiôr/Equiôr que me chamaram…”. Ele quer dizer: Estou aqui porque me chamaram” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-6-papai-paxa/

 

HINO 07 – DOIS DE NOVEMBRO

“Esse hino, uma pessoa chegou para o Mestre, uma pessoa de dentro do trabalho que havia acabado se separar da matéria. Essa pessoa chegou e cantou para ele. Era uma senhora, a segunda companheira dele, dona Francisca” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/hino-7-dois-de-novembro/

 

HINO 08 – A RAINHA ME MANDOU

“Uma vez perguntaram para o Mestre: – Mestre, qual é a maior obrigação para quem toma Daime? Aí, o Mestre respondeu: – Meu filho, a maior obrigação dentro desta missão é rezar! Isso é uma instrução para todos nós. Quanto mais se rezar, melhor. Não perder tempo. Não estou fazendo nada, estou rezando para não pensar coisa à toa. É isso que diz esse hino. Manda rezar para todos os irmãos, para a humanidade e para os inocentes” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 09 – MÃE CELESTIAL

“Esse hino, na missa, você canta a última estrofe com uma modificação: “Que te dê a salvação e te bote em bom lugar” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 11 – UNAQUI

“Esse hino ele recebeu numa quarta-feira santa, de quarta para quinta. Refere-se ao passamento de Jesus Cristo e lá embaixo ele diz: “Só me dão ingratidão”! Porque ele está dando o mesmo seguimento que Jesus Cristo veio dar aqui, ensinando a todos e não querem obedecer. Eu nunca perguntei a ele o porquê do nome Unaqui” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 12 – MEU DIVINO PAI

“A laranja é uma fruta/Redonda por vossas mãos/Vós me entrega com certeza/E eu deixar cair no chão?” A laranja é o globo, é o globo. Essa laranja que ele fala aí é o globo, todo o globo. “Vós me entrega com certeza/E eu deixar cair no chão?” Não devo, né?! É isso aí. Aí, tem um ponto de interrogação: é “E eu deixar cair no chão?” Não devo” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 13 – ESTRELA D’ ALVA

“Eu lembro de uma história bem acentuada, inclusive eu tenho muito carinho pela Estrela D’ Alva, até porque desde a primeira vez que vi ele contar essa história, eu fiquei impressionado e sedento de poder alcançar também algo assim, que fosse diretamente a Estrela D’ Alva. Isso se deu, ele contava para nós, entre ele e Germano Guilherme [primeiro discípulo]. Primeiro foi com ele [o Mestre]. Ele sentado no ponto de trabalho dele, divisou a Estrela D’Alva em determinado ponto. Aí, ele olhou para ela e pensou consigo: – Qualquer dia desse eu vou tomar Daime e vou naquela estrela. Aí, ficou nisso, quando em um determinado dia ele tomou Daime. Ora, não deu trabalho. Foi lá! Chegou lá, ela toda de vidraça, a coisa mais linda do mundo. Agora, só com o direito de avistar o que estava lá por dentro, sem entrar. Era uma vidraça tão transparente, que ele divisava tudo o que tinha lá por dentro. Tudo ornamentado, atapetado, a coisa mais linda! Uma morada muito bonita dentro da Estrela D’Alva. Aí, ele disse que era tão verdade ela ser de vidraça, que ele disse que passava a mão apalpando e sentia que era vidro. Aí, a gente pergunta: E o invisível se pega? Pega, invisível também se pega, porque ele pegou, ele apalpava. Aí, ele perguntou a mãe dele: – Minha Mãe, me diga uma coisa: Por que é que uma coisa excelente dessa, uma morada bonita como essa, eu procuro um morador, alguém que esteja habitando, e não vejo? Ela disse: – Meu filho, como essa aí, tem muitas e muitas outras esperando um filho com uma capacidade que mereça realmente vir habitar. Ele disse: – Sim Senhora, muito bem. Aí constatou tudo isso e retornou. Agora, o Germano era buraco como diz o caboclo, né? A primeira pessoa para quem o Mestre contou essa história foi o finado Germano, mas contou assim, a meio termo, e bem a meio termo mesmo, e disse, parece que olhando para a Estrela D’ Alva de novo: – Olha, maninho – mutuamente, eles se tratavam por “maninho”, era bonito mesmo, eu ainda conheci -, tu me acredita numa coisa? Germano respondeu: – Sim, maninho, não é tu que vai contar? Aí, o Mestre falou: – Tu acredita que eu fui lá naquela estrela? Germano disse: – Acredito. O senhor não está dizendo? E a conversa ficou só até aí. Ele deu ciência que foi até a Estrela e só. Germano também desejou nessa hora e afirmou consigo: – Eu também vou tomar Daime e vou lá. Ora, não deu outra. Quando foi em um determinado dia, ele tomou Daime e foi bater lá. Investigou  tudo direitinho. Terminada a investigação, ele voltou e foi levar a notícia para o Mestre: – Maninho, tu me disseste que foi naquela estrela, não foi? Fui Germano – respondeu o Mestre. Não é que eu também fui – falou, Germano. Daí,  o Mestre perguntou: – Então tu me contas como é lá. Aí, o Germano deu toda descrição do jeito que o Mestre viu. Então, o Mestre arrematou: – Tu foi mesmo. É assim! [risadas]. O Mestre sempre contava isso, a Estrela D’Alva. Então, naquele momento, ela ainda se encontrava assim, vazia” (Depoimento de Luiz Mendes do Nascimento a Florestan Neto, Rio Branco, 2000).

NOTA: “Buraco” era uma espécie de apelido de Germano. O sentido, baseado em sua personalidade, é o da conhecida expressão “Comigo o buraco é mais embaixo”. Germano era muito rigoroso e destemido.

 

HINO 14 – ROGATIVO DOS MORTOS

“Mestre Irineu profetizou a hora de sua passagem: nove horas da manhã. Você pode ver que o hino só vai até às nove horas. Pois, justamente, às nove horas da manhã do dia 6 de julho de 1971, nosso Mestre deixou este mundo” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2000).

NOTA: estudo teológico/esotérico do hino: https://evangelhodejuramida.com.br/mestre-irineu-e-a-cronologia-da-via-crucis-hino-14-rogativo-dos-mortos/

 

HINO 16 – A MINHA MÃE É A SANTA VIRGEM

“Bom, a gente começa a interpretar logo por ser o Mestre. O Mestre sabia tudo, até tocar. Porque uma vez, ele mirando, chegou uma Senhora com um acordeom muito bonito, depositou nas pernas dele e mandou ele tocar. Ele disse para Ela que achava impossível porque ele não sabia tocar, mas Ela insistiu tanto, dizendo que ele sabia, que ele conseguiu mexer na sanfona, porque Ela disse para ele que bastava ele puxar. Quando ele abriu a sanfona, já foi tocando e cantando: “A minha mãe é a santa Virgem/Ela é quem vem me ensinar/Não posso viver sem ela/Só posso estar onde ela está…” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2000).

 

HINO 23 – B.G.

“O B.G. é ele mesmo, é ele próprio. Pode cantar e pode reparar que é” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

“Quem foi que veio à Terra para ensinar a verdade, a não ser o próprio Mestre? Eu acho que termina sendo é ele mesmo o B.G., o mesmo ser” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2000).

 

HINO 24 – CANTAR PRAIA

“Cantar praia. Olha, aí tem uma interpretação. Cantar para ir… Não é a praia daqui do chão, não! É como estivesse dizendo “cantar pra ir”. É para deixar a pessoa embaralhada, para ver se vai buscar, né? Cantar pra ir…” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 27 – SEIS HORAS DA MANHÃ

“O Mestre era um assíduo prático; é aquilo que tenho dito. Duvido que o nego chegasse lá na casa do Mestre às seis horas da manhã, e o Mestre já não estivesse no pontinho dele. Não era outra coisa não, já era saudando o Sol” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2000).

 

 

HINO 29 – SOL, LUA, ESTRELA

“Logo que o Mestre recebeu Sol, Lua Estrela, passou a abrir seu hinário cantando primeiro esse hino. Quando, a seguir, ele recebeu Devo Amar aquela luz, também anexou esse hino na abertura d’ O Cruzeiro” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2000).

“Vou falar um pouco da obra de Deus que o Mestre fala e mostra para todo mundo e ninguém procura entender. O Sol em primeiro lugar. Ele nos dá a luz do dia e o calor, nos supre de energia. É o deus masculino, nós sem essa luz não somos nada, o Sol é o Rei do Dia. A Lua representa o deus feminino, a Rainha da Noite, nos clareia, nos supre de energia e nos fornece o frio para equilibrar a temperatura do corpo. Ela é quem cuida de toda natalidade, nos dá boa parte de nossa energia. O Sol clareia a terra nos fornecendo alimento. A Lua amplia a máquina humana para equilibrar o alimento para fornecer energia para o corpo. A Estrela completa uma das três pessoas da Santíssima Trindade que representa no firmamento. É ela quem fornece a forma do corpo humano, quem representa os outros planetas e suas capacidades. O Sol, a Lua e as estrelas, esses três é quem geram tudo e criam tudo. Eles geram o vento, o vento a água, e a água cria tudo. Aí estão as três pessoas do firmamento. O vento, a terra e o mar são três pessoas que estão agindo com ordem superior. O vento é quem fornece água e essa é quem cria tudo, do reino animal ao reino vegetal ao reino mineral. O vento é que movimenta a vida de tudo e todos e anuncia sinal de vida. É o nosso fôlego. A terra é a mãe criadora que nos cria e tem paciência com nós por ficarmos por cima dela e fazermos o que bem quisermos. Tem ser vivente que usa e abusa, e ela depois ainda guarda tudo, o bom e o ruim. O mar é o poder de Deus banhando a terra, lavando a iniquidade do homem que é, de todos os animais, o que pratica o pior. O mar também representa o sangue sagrado da Terra. De todos os animais, o homem era para ser o melhor, mas por ele não se conhecer que é um filho de Deus, tornou-se o pior de todos os animais. Capriche para todos entender, para aprender a obra de Deus tendo humildade, obediência e boa vontade. Peça ao nosso protetor Juramidã, que ele está pronto para lhe atender e lhe explicar tudo” (Depoimento do contemporâneo de Mestre Irineu, Mestre Virgílio, colhido em Porto Velho (RO) por Arneide Bandeira Cemin, incluído em sua tese de doutorado Ordem, Xamanismo e Dádiva, USP, 1988, Vol. 2, p. 395).

 

HINO 33 – PAPAI VELHO

“A caducação não significa a senilidade, mas sim a doutrina que Mestre Irineu conseguiu desenvolver com nova roupagem para o novo tempo. A dedicação de alcançar o conhecimento da verdade e transferi-lo ao seguidores exigiu do homem Raimundo Irineu Serra a extremada dedicação durante a existência material. Para consolidar a base doutrinária, o Mestre teve que percorrer os mesmos caminhos de tentações, traições e espinhos trilhados quando esteve com a humanidade como Jesus Cristo” (Sebastião Jaccoud, contemporâneo de Mestre Irineu, em sua obra Terceiro Testamento – Um Fato Para A História, 1992, p. 37-38).

NOTA: “Caducação – “Até que enfim, até que enfim, até que enfim/Eu recebi o meu bastão/Pude me levantar/Com minha caducação” (33:2) – diz respeito, então, a persistência do Mestre e não à sua senilidade.

 

HINO 36 – AMIGO VELHO

“O amigo velho é São José. Ele se refere a São José. Pode prestar atenção. Lá na frente ele se explica” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 37 – MARESIA

“A maresia é porque … Olha, este trabalho tem muita envolvência com o mar. Do mar vem muita força; a força divina vem do mar também. Do céu , da terra e do mar” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

 

HINO 38 – FLOR DE JAGUBE

“Tudo vem dela, tudo vem da floresta, né, como tem um hino que diz assim: “Eu venho da floresta…”. É o Daime quem está falando. O nome desse hino chama-se Flor de Jagube. Os meus irmãos todos que vem são os outros jagubes e as folhas que vem da mata, que a gente vai lá buscar. Todos trazem este ensino, tudo já vem dentro do cipó a da folha, que ninguém coloca nada dentro do Daime, a gente coloca bons pensamentos… Por onde é que vai colocar, se é coisa do invisível? Que a miração é como a luz, o vento. Quem pega no vento, quem pega nessa luz aí do Sol, e estamos vendo né, é coisa do invisível. A Virgem Mãe que nos mandou… A mata não é virgem? Mata virgem. Então, é como se diz, os hinos são parábolas” (Francisco Granjeiro Filho, feitor de Mestre Irineu, entrevistado por Arneide Bandeira Cemin, citado em sua tese de doutorado Ordem, Xamanismo e Dádiva, USP, 1988, vol. 2, p. 287).

 

HINO 39 – CENTRO LIVRE

“O nosso Centro é livre mesmo, liberado para quem quiser entrar, para quem quiser seguir. Teve até um tempo que o nosso Centro teve o nome de “Centro Livre”, até que depois mudaram, mas o nome era “Centro Livre” mesmo. O Currupipipiraquá é outro caboclo, e não é Currupipipiraguá com “g”; é Currupipipiraquá com “q”. É um caboclo índio, é um caboclo finíssimo, ele” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: Centro Livre foi a denominação pioneira. Depois vieram Centro Rainha da Floresta, Centro de Irradiação Mental Tattwa Luz Divina e, por fim, Centro de Iluminação Cristã Luz Universal (Livro Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e Seus Companheiros, p. 297-304). Em nenhum momento de sua missão, Mestre Irineu usou a denominação “igreja” para designar o local de suas sessões espíritas-esotéricas. Centro Livre… Livre de clericalismo, proselitismo, comércio do sagrado, culto à personalidade e dogmatismo cego.

 

HINO 43 – O PRENSOR

“”O prensor que te aparece/A pátria vai abraçar/Vai pra guerra vai perder/A vida que Deus te dá…”. O prensor é uma força. Aquela força que domina, não é? Então, vem aquela ordem direta, vamos dizer: a guerra começou, aquela ordem material, tem que brigar, querendo ou não, não é? É isso é que diz O Prensor. Ele recebeu esse hino numa concentração lá na Vila Ivonete, mais ou menos pelo começo da década de 1940. Aí, quando ele recebeu esse hino, estava no forte da Concentração. Ele se levantou, colocou um irmão na presidência do trabalho e se retirou, chamou a esposa dele [à época], a dona Raimunda, e pediu que ela me chamasse. Aí, ele cantou o hino todinho. Quando terminou a Concentração, ele cantou para todo mundo ouvir, para todo mundo aprender logo. Olhe, nessa época foi na época de um conflito armado entre Bolívia e Paraguai. Mas estava nesse tempo um clamor, só se sabia das notícias. Do outro dia em diante que saiu esse hino, acalmou tudo, zerou tudo. Ele contou que no trabalho dele, ele foi espiritualmente lá, no meio da batalha. Diz ele que era bala que chovia assim para lá e para cá, batia nele e caía. Ele estava lá espiritualmente, quando chegou o hino para controlar. A força dominar a rebeldia, que era demais. O que é certo meu filho é que esta é uma das representações que nós temos que mostrar, e vários hinos que tem aí cada um traz uma referência” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: à época do depoimento, que foi colhido por mim na casa de Percília, ela contava 74 anos, relatando uma história que havia se dado há quase 60 anos. Digo isso, porque é muito provável que tenha se equivocado em relação à guerra. A Guerra del Chaco, citada por Percília, ocorreu entre Bolívia e Paraguai no período de 1932 a 1935, ano em que ela – como relatado acima no hino Lua Branca – chegou ao Daime com apenas nove anos, testemunhando que o Mestre só havia apresentado um hino, o primeiro. Como Percília cita a data de 1940 deduz-se que, na verdade, trata-se da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O que é corroborado pelo depoimento de Zulmira Gomes, filha de Antônio Gomes da Silva e mãe de Madrinha Peregrina, consorte de Mestre Irineu e dirigente do CICLU-ALTO SANTO:

“Quando um cunhado de Mestre Irineu foi convocado para seguir com as tropas brasileiras durante a Segunda Guerra Mundial, várias sessões foram feitas em seu benefício. Chegou até receber um hino em que pedia a Virgem Maria para defender os inocentes de todo aquele terror. O cunhado acabou sendo dispensado e voltando de Manaus, sem partir para os campos da Europa” (Entrevista concedida ao jornalista e condiscípulo Antônio Alves e disponível no livro Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e Seus Companheiros, de Paulo Moreira e Edward MacRae, 2011, p. 214).

 

HINO 47 – SETE ESTRELAS

“Então, quem é que ele viu no Sete Estrelas? Jesus, filho de Maria. O rosto superior que ele viu, foi o rosto de Jesus Cristo”. (Percília matos da Silva, Rio Branco, 2000).

NOTA: baseado na monografia do condiscípulo Jairo Carioca (Doutrina do Santo Daime, A Filosofia do Século, 2000, p. 42), à época da publicação do hino (primeira metade da década de 1940), vigorava no batalhão de Mestre Irineu uma hierarquia baseada em patentes, que iniciava com “Uma Estrela” (Soldado Raso) e terminava com “Seis Estrelas” (General). Assim, deduzo que uma das possíveis formas de entendermos o hino é considerar Jesus como o de maior graduação (“Sete Estrelas”).

 

HINO 57 – EU CONVIDO MEUS IRMÃOS

“Eu era criança, quando eu ouvi eles conversando, que ela [Raimunda, terceira companheira do Mestre] recebeu um hino. Ela colocou n’ O Cruzeiro e ficou. O hino se chama “Eu Convido Meus Irmãos”. Mas ela recebeu assim: ele [o Mestre] cantando pra ela… às vezes, se recebe hino na miração, mas ela recebeu o hino sonhando. Os sonhos, às vezes, pra quem toma Daime é um sonho verdadeiro, que nem é uma miração, não é? O que a gente não viu mirando e tomando Daime, às vezes vem no sonho, né? Tem coisa que se você for vê mirando não aguenta, né? E no sonho talvez é mais maneiro, ao menos eu penso assim. Ainda hoje eu tenho em minha lembrança. É mesmo que estar vendo ela cantando esse hino. Esse hino, toda vez que eu estou cantando, é mesmo que estar vendo ela; o jeito dela cantando, ela cantava tão bonito. Eu ainda não vi ninguém cantar igual como ela cantava, a voz dela era muito suave, bonita mesmo”  (Depoimento de Adália Granjeiro, filha de Antônio Gomes, a Paulo Moreira em fevereiro de 2007, e publicado no livro Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e Seus Companheiros, p. 222).

 

HINO 64 – EU PEÇO A JESUS CRISTO

“Em mais um dos hinos, Eu Peço a Jesus Cristo, Mestre Irineu publicou que detém as forças da floresta e do astral que lhe são dadas por sua mãe, a Rainha da Floresta, e chama os três reis do oriente pelos nomes de Titango, Agarrube e Tituma. A esses três seres divinos Deus confiou o poder de zelar pela luz resplandecente da corte celestial. Para retribuir a pureza e o amor manifestado pelos Reis do Oriente, Mestre Irineu, reverente, confiou a eles a entrega de todos os trabalhos realizados sob seu domínio. A celebração dessa data é encerrada com uma cerimônia de apresentação e entrega individual dos trabalhos espirituais pelos seguidores da Doutrina ao superior hierárquico” (Sebastião Jaccoud em O Terceiro Testamento: Um Fato Para A História, 1992, p. 49-50).

 

HINO 72 – SILENCIOSO

“O Mestre era realmente silencioso, falava bem macio. Ele não era homem de falar alto. Ele dava as explicações dele para todo mundo, atendia todo mundo muito bem. Ele ensinava como um pai, como um pai pode educar um filho. Ele ainda dizia mais. Ele era alto, tinha 1, 98m e, no entanto, dizia: – Olha, eu sou mais alto que todo mundo, entretanto, eu me torno bem pequenino, igualmente a criancinha menor que tiver aqui” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

“O Mestre deixou de tomar pinga [cachaça] mais ou menos em 1945. Por aí assim que ele deixou, foi quando saiu aquele hino Silencioso. Depois que ele recebeu esse hino, deixou a bebida definitivamente e proibiu a todos os fardados de tocarem em bebida alcoólica e ainda disse mais: que todo aquele que tomasse Daime e depois bebesse bebida alcoólica, ele chamaria de sem-vergonha. Ele anunciou isso para todo mundo escutar. Esse hino foi como que uma instrução e cura, pois pode ver que lá na última estrofe, ele fala e suplica pela cura: “Silencioso/Eu chego no jardim/Eu peço a Virgem Mãe/Que vós tenha pena de mim”. A Virgem Mãe ouviu e atendeu proibindo definitivamente, não só para ele, mas a todos que estavam na linha. O Daime não dá certo com pinga. O Mestre dizia que o Daime só dá certo com paz, união, com seriedade e boas conversas” (Depoimento de Pedro Domingos da Silva (companheiro de Percília Matos) a Florestan Neto, Rio Branco, 2000).

 

HINO 74 – SÓ EU CANTEI NA BARRA

“Esse hino também faz menção à passagem de Antônio Gomes da Silva; com três dias que saiu esse hino, ele fez a passagem” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2000).

“Quando o vovô Antônio Gomes chegou [1938], chegou doente mesmo. O Padrinho Irineu que levantou ele. Ele ainda viveu uns anos. Só que chegou o momento de ele fazer a viagem, inclusive quando estava pertinho, ele mandou chamar o Padrinho Irineu, mandou minha mãe lá [Adália Gomes, filha]. Minha mãe foi lá e chamou; ele já não estava mais aquentando, chamou o Padrinho Irineu para dar uma solução que ele estava com medo da morte. O Padrinho Irineu ainda não tinha recebido o hino Só Eu Cantei Na Barra. Não sei se você sabe dessa história, se a tia Preta (Cecília Gomes, filha de Antônio Gomes e viúva de Germano Guilherme) já contou. O Padrinho Irineu chegou lá, aí o vô Antônio Gomes disse: – Estou com medo, Estou sem conforto, Eu sei que vou morrer. Aí o Padrinho Irineu respondeu: – Calma! Eu vou te dar uma resposta, mas não agora. Aí o Padrinho Irineu foi para casa, tomou Daime para… porque, antigamente a pessoa chegava com algum problema assim, ele tomava Daime e ia buscar a cura lá em cima, né… só que ele tomou Daime e aí veio o hino Só Eu Cantei na Barra. O Padrinho Irineu foi lá onde estava o vô e disse: – Eu trouxe a resposta que estava te devendo. Daí o Padrinho cantou o hino para o vô Antônio Gomes. Depois que ele cantou, chegou o conforto para ele. Ele compreendeu a mensagem. Naquele momento que o vô Antônio Gomes estava passando, naquele sofrimento, foi uma palavra de conforto muito grande. Aí o vô mandou reunir as pessoas, a família toda, mais os irmãos e mandou rezar, começar a rezar. Vovô Antônio Gomes disse: Comecem a rezar, a rezar, a rezar… Aí ele fechou os olhos e nunca mais acordou para a vida material” (Depoimento de Valcírio Granjeiro, neto de Antônio Gomes, a Florestan Neto, Rio Branco, 2001).

 

HINO 75 – AS ESTRELAS

“”Os caboclos já chegaram…” O Mestre fazia os trabalhos de cura, e chamava pelos seus caboclos. Tantas curas que ele fazia… chamados bonitos! Lindos os chamados, mas ele não ensinava os chamados para todo mundo, porque todo mundo não sabe usar, né! Ele dizia que não ensinava, porque todo mundo não sabe usar, e depois que se apossasse do chamado, ia querer fazer coisas fora do comum, por isso ele não ensinava” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

“Muitas perguntas foram feitas ao Mestre e elas não ficavam no vazio porque ele sempre respondia. Aí, a pergunta foi do compadre Chico Granjeiro acerca do hino As Estrelas. Ele diz que subiu serra de espinhos, pisando em pontas agudas. Foi aí que o Granjeiro perguntou: – Padrinho, e esses espinhos e pontas agudas? O Mestre respondeu: – Chico, são as línguas! Ele apontou para a dele e disse: – é isso aqui, é a língua, são as línguas. Aí, se subentende que cada “linguada”  do linguarudo é um espinho! E é serra. Serra de espinhos. Ponta de língua, falatório. É caracterizado como espinhos de pontas agudas. Então daí a interpretação. Pergunta do compadre Chico Granjeiro, e resposta do Mestre” (Luiz Mendes do Nascimento, Capixaba, AC, 2001).

 

HINO 76 – A VIRGEM MÃE É SOBERANA

“Esse hino, era um irmão que conhecia o Mestre, mas não respeitava o Mestre. Era um carvoeiro, vivia fazendo carvão. Ele não era do Daime. Vivia lá perto, mas não era. Aí, por ignorância dele, vivia chamando o Mestre de carvão. Aí, o resultado: pegou uma doença, que começou a pipocar os ossos dele. Ele foi bater lá no Mestre com os ossos… uma doença que quebrava os ossos dele. Aí, quando ele chegou lá, não tinha mais jeito para a matéria, mas tinha no espírito. Então, o que o Mestre conseguiu trabalhar nele foi o espírito. Aí, quando esse homem estava ali expirando, desencarnando, fazendo a passagem dele, o Mestre recebeu o hino. Então, o hino foi a resposta do que o irmão tinha aprontado. Essa história foi contada por um adepto do seu Raimundo Gomes [filho de Antônio Gomes], que foi o seu Raimundo Gomes quem tinha passado a limpo essa história, mostrando aos irmãos o quanto merecia respeitar o Mestre. Em outras palavras, quem desrespeitava o Mestre, o que merecia” (Depoimento de Francisco Corrente a Florestan Neto, Fazenda São Sebastião, Igarapé Mapiá, Pauini, AM, 2001).

 

HINOS 81, 82, 83 – PROFESSOR, CAMPINEIRO E DIVINO PAI ETERNO

“Pois é, esses hinos já é ele avisando que vai embora. Esses hinos saíram numa época em que ele estava muito perturbado com uma família que ele teve com a outra mulher dele, a dona Raimunda. A sogra dele bebia cachaça e perturbava demais. Que Deus a tenha, que já está lá na eternidade, mas a velha não se rendia de jeito nenhum. Ela tanto insistiu, até que tirou a filha da mão dele. Ela resolveu que ia embora e levou a filha. Elas foram para São Paulo. (…) No hino campineiro, na terceira estrofe, cantamos assim: “Me acho fraco e cansado/De lutar com rebeldia/Fazer gosto a quem não tem/Esperança de um dia”. Não existe  a palavra “na”. É só “Esperança de um dia”. Muda o sentido do hino“ (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

 

HINO 86 – EU VIM DA MINHA ARMADA

“Ele não veio mandado? Veio mandado, né. “Armada” que fala é como já falei. Nós somos de um batalhão, de um quartel, quartel divino da sempre Virgem Maria de nosso Senhor Jesus Cristo. Essa é que é a armada” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

“O Chico Granjeiro explicava para nós, né, que ele conversando com o Mestre, o Mestre falou para ele, né, que o Mestre passou os altos e baixos dele… até do ponto de vista de querer renunciar esse trabalho, se afastar… aqui e acolá por força das incompreensões. Quando saiu Eu Vim Da Minha Armada, ele estava numa passagem de descontentamento e com vontade de fechar a sessão. Aí, saiu o hino: “Eu vim da minha armada trazer fé e amor…”. Porque a complementação já é a Rainha dizendo para ele: “Não despreza teus irmãos, mostra tua luz de amor” (Luiz Mendes do Nascimento, Capixaba, AC, 2001).

 

HINO 91 – CHORO MUITO

“Esse hino relembra a passagem da Maria Damião” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

 

HINO 92 – SOU HUMILDE

“O Mestre era muito humilde mesmo, não tinha vaidade com ele não, tudo para ele era na paz. Só na paz, na humildade. Era muito humilde, ele…aquilo era lento…em tudo, por tudo. Tudo dele era com calma, com prudência” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

 

HINO 94 – PERGUNTEI A TODO MUNDO

“Não estavam acompanhando. Ele pelejando com todo mundo, como ainda hoje acontece. Muita gente diz ser daimista, mas não segue os ensinos que o Mestre deixou. Em vez de seguir a Doutrina, vão seguir outros ramais” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

 

HINO 96 – AS CAMPINAS

“Meu tio contou a história desse hino pra mim. Ele tomou o Daime e quando abriu a miração, ele começou a ver vários irmãos; mas assim, uns maiores, outros menores, uns de um jeito, outros de outro jeito, dentro de uma desarmonia. Ele me disse que, de repente, passou como que uma régua dentro da miração, nivelando tudo, deixando além de uma igualdade, uma harmonia. Então, ele me disse que era assim que ele queria ver o batalhão dele, sem grande nem pequeno, sem bonito e nem feio, sem um querendo ser maior que o outro, e isso era o  formoso batalhão!” (Entrevista de Daniel Serra, sobrinho de Mestre Irineu, a Florestan Neto, Rio Branco, AC, 2003).

 

HINO 97 – CENTENÁRIO

“O Traí é uma corneta, é o som de uma corneta, não é entidade não!” (Percília Matos da Silva, Rio Branco, 2001).

 

HINO 100 – EU SOU FILHO DA TERRA

“Seu Chico Granjeiro foi o segundo ou o terceiro feitor de Mestre Irineu, depois que o Mestre parou de fazer Daime. Teve o João Pereira e umas pessoas antigas aí. Seu Chico Granjeiro foi destacado assim que chegou. o Mestre já olhou pra ele e entregou todo o serviço da mata pra ele cuidar. Aí o seu Chico Granjeiro disse: – Mas Mestre… Aí o Mestre disse: – O senhor já chegou achando Jagube, chegou achando Folha. E o papai [Júlio Carioca] quando conheceu o seu Chico Granjeiro se apegou muito com ele. Chegou até a passar de 15 dias na casa dele. Se apaixonou pelo seu Chico Granjeiro. Passaram muito tempo juntos, muitas conversas entre os dois sobre essas coisas. Daí um dia, o papai em uma dessas conversas com Mestre Irineu, disse: – Mestre, eu queria que o senhor me ensinasse a encontrar um Jagube na mata, porque eu vejo o compadre Chico com muita facilidade, ele vai lá e encontra, e eu tenho muita dificuldade. Queria que o senhor me ensinasse. Aí o Mestre disse: – Seu Júlio, é muito fácil. As pessoas é que fecham os olhos pra Ele, mas Ele não fecha os olhos pra nós, não. Mesmo que a pessoa não veja, Ele até faz um sinal na mata, seu Júlio. Você vai andando na mata procurando pra cá, procurando pra lá, aí escuta um toque lá longe: páaaaa, páaaaa, páaaaa… Aí você tem que ver da onde veio esse som. Se você procurar da onde é que veio, a direção, você vai… Mas tem que estar preparado, seu Júlio! Para entrar na mata tem que estar preparado, saber entrar na mata… aí Ele conversa com o camarada. Entra na mata e não pede nem licença a Rainha da Floresta, entra de qualquer jeito, não se preparou [dieta]… como é que vai escutar o som, escutar o toque que Ele dá? Se escutar e seguir a direção vai lá onde Ele está. Nessa época que o papai perguntou para o Mestre, ainda não tinha nem esse hino recebido, foi mais lá pra frente. Quando o Mestre apresentou esse hino, o papai estava na sede. Aí ele disse: – Ah, é esse toque, o toque que o Mestre falou pra mim, agora fiquei sabendo… O papai se despertou: “Aqui eu toco meu tambor e nas matas eu rufo caixa…”. Parábola que é preciso se estudar” (Depoimento de Guido Carioca, filho de Júlio Carioca, a Florestan Neto – via WhatsApp, novembro de 2022).

 

HINO 104 – SEXTA-FEIRA SANTA

“Quando eu cheguei na sessão, o feitio já era na direção do Chico Granjeiro. Agora, o Chico Granjeiro determinava umas dietas mesmo. Isso depois, deu foi um rebu [confusão] danado, rapaz. Que a gente deu um certo cumprimento, deu. Eu pelo menos cheguei a cumprir, dieta sexual, né. (…) Até três meses, ia a trinta dias e chegava a três meses. Aí foi onde entrou os questionamentos, deu um rebu. Quer dizer, depois de uma temporada que se cumpria isso aí; porque eu fiz bonitas vezes um mês, depois outros asseguravam que faziam, fizeram. Mas isso chegou a um ponto vulgar. Começaram a brigar, até briga de casal, e conversa e tal, e julgamento. Quem tirou a dieta, quem não tirou; virou assim, uma farofa. Aí, pronto, caiu nos pés do Mestre. Ele se pronunciou: – Não, gente. Não é isso tudo, não. Agora vai mudar. Agora é três dias antes e três depois. (Depoimento de Luiz Mendes do Nascimento a Florestan Neto. Capixaba, AC, 2001).

NOTA: há uma dúvida frequente entre os adeptos do Daime: a dieta é só para a sexta-feira santa ou para todos os trabalhos? Segundo Luiz Mendes, a dieta é para ser cumprida todas as vezes que vamos tomar a Santa Bebida. À época, citou o caso do contemporâneo João Rodrigues Facundes, o popular “Seu Nica”, que presidiu o Centro Rainha da Floresta, um dos quatro centros do bairro Irineu Serra. No dia de um hinário de farda branca, que Luiz Mendes não soube precisar a data, Nica procurou o Mestre para lhe confessar que havia “quebrado a dieta”. Mestre Irineu permitiu a ele participar do hinário caso desejasse, mas sem tomar Daime! Foi o que seu discípulo fez. Outra observação de Luiz Mendes à minha pessoa: o Mestre lhe disse em tom de alerta, que, quem não respeitasse a dieta, quebrando-a rotineiramente, poderia adoecer ou ficar louco!

 

BENDITO DA SEXTA-FEIRA SANTA

“A história do Bendito, eu ainda não tomava Daime. Eu tinha uns 9 anos. Lá por perto de casa, sempre no mês de maio, mês de Maria, tinha umas senhoras que rezavam o Terço, faziam novena, e eu sempre lá. Depois que rezavam o Terço, cantavam aqueles benditos [cânticos da liturgia católica], e lá, elas cantavam esse Bendito da Sexta-feira Santa. Eu me lembro que essas senhoras eram até do Ceará. Aí, eu aprendi esse bendito de memória. Tem até uma história, uma pessoa já me disse que esse bendito foi o Padre Cícero que recebeu. Quando foi um dia, eu lembrei de cantar para o Padrinho Irineu. Ele achou muito bonito, combinava mesmo com a passagem da sexta-feira santa. Quando eu cantei para ele, foi logo próximo da semana santa, e aí ele mandou eu cantar no Trabalho. Eu cantei depois do Terço, no intervalo e no final do trabalho. Aí, todo ano ele pedia para cantar na semana santa” (Depoimento de Francisca Mendes, irmã de Luiz mendes, a Florestan Neto, Bujari, AC, 2001).

A seguir, a letra do Bendito da Sexta-Feira Santa (canta-se repetindo as estrofes).

 

NA QUARTA-FEIRA JESUS COM SEUS DISCÍPULOS

FOI A OLIVEIRA, FOI A JERUSALÉM

FOI A PÁSCOA, MEU JESUS COM SEUS DISCÍPULOS

QUE PADECEU A FAVOR DO NOSSO BEM

 

NA QUINTA-FEIRA JESUS BANHOU OS PÉS

COM GRANDE GOSTO, PRAZER E CONTENTAMNETO

DEPOIS DA CEIA, MEU JESUS RESTITUI-SE

COM GRANDE GOSTO MEU SANTÍSSIMO SACRAMENTO

 

NA SEXTA-FEIRA JESUS SUBIU AO HORTO

FOI REZAR TRÊS HORAS DE ORAÇÃO

ENCONTROU JUDAS NA FRENTE DE UMA TROPA

JÁ VINHA ELE DE ALFERES CAPITÃO

 

JUDAS PELO LADO DIREITO

COM FALSIDADE LHE BEIJOU DIVINAMENTE

JESUS DISSE: – EU CONHEÇO A FALSIDADE

COM ESTE BEIJO QUE AGORA TU ME DESTES

 

NESTE DIA NOSSA SENHORA CHEGOU

ÀS OITO HORAS SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO

ENCONTROU-SE COM SEU FILHINO PRESO

MADALENA, Ó QUE DOR NO CORAÇÃO

 

DEPOIS DE JESUS CRISTO ARRASTADO

COBRIRAM ELE EM TRONO PEQUENINO

LHE BOTARAM UMA COROA NA CABEÇA

ERA TECIDA COM SETENTA E DOIS ESPINHOS

 

DAÍ SAÍRAM COM JESUS A RUA ESTREITA

CERTAMENTE A RUA DE AMARGURA

ENCONTROU-SE COM A SEMPRE VIRGEM MARIA

ERA SUA MÃE QUE CHORAVA COM TERNURA

 

Ó, MINHA MÃE, QUE POR MIM TANTO CHORAVA

SENDO ELA, MARIA E MADALENA

QUANDO EU CUIDO QUE VINHA A MEU SOCORRO

CADA VEZ MAIS REDOBRAVA A MINHA PENA

 

CHEGOU LONGUINHO COM A LANÇA E CRAVOU

NO PEITO ESQUERDO, EM CIMA DO CORAÇÃO

QUANDO O SANGUE LHE BATIA PELO ROSTO

SE AJOELHOU, A MEU DEUS PEDIU PERDÃO

 

NOTA: no segundo verso da quarta estrofe, “Com falsidade lhe beijou divinamente”, o advérbio “divinamente”, que significa “de modo divino”, deve ser entendido na acepção que traduz “divino” por “perfeito, sublime” (Houaiss, 2009). Ou seja, ao beijar Jesus “divinamente”, Judas o beijou com sublime falsidade!

NOTA 2: em relação a sexta-feira santa, dia da prisão, tortura e crucificação de Jesus, convido o leitor a acessar o estudo teológico/esotérico do hino 14, “Rogativo dos Mortos”, através deste link: https://evangelhodejuramida.com.br/mestre-irineu-e-a-cronologia-da-via-crucis-hino-14-rogativo-dos-mortos/

 

HINO 108 – LINHA DO TUCUM

“Um chamado que é da linha do hinário, é o Tucum. Esse é um chamado também, o Tucum. Por exemplo: a pessoa está mal de vida, está mal assistida, e não está se sentindo bem…pode fazer um trabalho com ele. Tucum é o nome de um caboclo. É uma entidade de muita força, de muito poder. Você reza três Pai Nosso até onde diz “Livrai-nos, Senhor, de todo mal”. Aí, pede licença ao Mestre Juramidã para chamar o senhor Tucum. Chama três vezes [canta o hino], repete três vezes seguidas e fecha com a Salve Rainha. Depois dessa Salve Rainha, você faz os seus oferecimentos. Oferece ao Mestre e a sempre Virgem Maria aquelas preces que foram rezadas naquele momento e ao senhor Tucum, para ele ajudar. Se não é o senhor, é fulano, é sicrano ou beltrano, também o senhor peça em nome dessas pessoas que estão necessitadas, para nos dar conforto, nos proteger e nos livrar de todo mal para podermos seguir na linha, livre de todas as perturbações. Aí oferece também a um santo de sua preferência, ao santo anjo da sua guarda, ao santo anjo da guarda daquele que também está perturbado, oferece as cinco chagas da sagrada paixão e morte de nosso senhor Jesus Cristo e a Nossa Senhora do Desterro, para que sejam desterrados todos os males, todas as perseguições, perversidades e perturbações de toda natureza para a zona do mar sem fim, onde cristão nenhum habita. Você faz esse pedido, esse oferecimento três vezes seguidas, quarta, quinta e sexta ao pôr do Sol. Aí, eu quero ver… Você sabia que, muitas vezes a pessoa está perturbada, aperreada e sofrendo disso e daquilo… a doença não é material, é espiritual. Entidades espirituais, malfazejos que ficam perturbando as criaturas” (Depoimento de Percília Matos a Florestan Neto, Rio Branco, AC, 2001).

NOTA: segundo Percília Matos, zeladora d’ O Cruzeiro, nos dias em que o hinário de Mestre Irineu é cantado, canta-se o hino Linha do Tucum uma única vez. Não há repetição.

 

HINO 115 – BATALHA

Esse hino, o penúltimo antes dos Hinos Novos (117-129), foi recebido por volta de 1955, considerando que Mestre Irineu ficou dez anos (1958-1968) sem receber hinos após o de número 116, Sou Filho do Poder.  O Mestre gostava de cantá-lo para animar seu povo. Segundo depoimento do contemporâneo João Rodrigues Facundes à minha pessoa (2001), “(…) Naquela época o povo do Alto Santo foi contaminado por uma gripe muito forte, batizada de “coreana”, que esmoreceu o povo. Assim, o Mestre saiu com esse hino para levantar seus irmãos”. A partir daí, segundo alguns contemporâneos, passou a usar esse hino como uma forma de incentivar seus irmãos em momentos difíceis. Por exemplo, quando o partido que tinha a simpatia do Mestre (PSD) perdeu as eleições de 1962 para o PTB. Os correligionários do PSD se dirigiram à casa do Mestre se lamentando, pois dentre outras consequências, surgiram rumores de que os adversários políticos poderiam “tomar” as terras de Mestre Irineu. Os fatos acima são relatados por dois contemporâneos, Daniel Serra e Luiz Mendes.

“(…) Era o PSD o partido do Mestre. O PSD depois passou a ARENA. Então o PSD perdeu para o PTB. O pessoal do partido dele chegou lá para se lamentar: – Mestre, nós perdemos! O que nós vamos fazer?! Aí o Padrinho cantou: “-Entrei numa batalha/Vi meu povo esmorecer/Temos que vencer/Com o poder do senhor Deus…”. Isso porque o pessoal do outro partido que ganhou ameaçou tomar as terras dele. Ele cantava o hino e dizia que ia se levantar de novo. Aí, veio o golpe de 64 e colocou esse pessoal do PTB para baixo. Quando houve o golpe, o Mestre tomou Daime e consultou a Mãe dele sobre a posição que ele tinha que assumir. A Virgem Mãe na miração respondeu: “Irineu, é melhor você ficar no coice do fuzil do que na boca!”. (Depoimento de Daniel Serra, sobrinho de Mestre Irineu, a Florestan Neto, Rio Branco, AC, 2001).

“(…) Na verdade, antes do golpe de 1964 eram dois partidos que influenciavam à época, isso quando passou a ser eleição. Aí, era o PSD e o PTB. O PSD era o partido do Mestre. Ele tinha partido, PSD. O partido do Mestre perdeu as eleições de 1962 e aí ele cantou Batalha já confortando”. Nesse ponto, há uma mudança de contexto no depoimento: “(…) Rapaz, se você visse, assim, o contentamento do Mestre tão transparecido, quando ele cantou esse hino, pelo menos a primeira vez que ouvi e vi, ele dançava. Isso é um xote. Ele chamou a comadre Peregrina, que ela dança bem, e aí mandou a turma cantar e dançar na sala ao som do Batalha. Dá um xote que é uma beleza!” (Luiz Mendes do Nascimento, Capixaba, AC, 2001).

 

HINOS NOVOS

 

HINO 118 – TODOS QUEREM SER IRMÃOS

“Realmente, o Padrinho recebia esses hinos e tinha toda a satisfação de apresentar. Os que moravam com ele eram os primeiros, mas também apresentava para quem vinha chegando, como era o meu caso. Ele tinha aquela satisfação. Aí num dado momento em que apareci lá, ele disse: -É Luiz, tem um hino novo aí! Você quer ouvir? Aí eu disse: – Com toda satisfação! Ele chamou a comadre Peregrina, a Maria Zacarias e ordenou: – Cantem esse hino aí para o Luiz ouvir. Mas daí, nesse interim, vinha chegando o nosso irmão Júlio Carioca, que também tomou parte. Foi subindo, foi tomando benção para o Padrinho, que foi dizendo: – Júlio, eu tinha pedido aqui para as meninas cantarem um hino novo para o Luiz, mas aí você chegou…então também é para você. Quer ouvir? Ele disse que sim, e começaram a cantar o hino. Cantaram uma vez, duas vezes, três vezes. Quando terminaram, ele perguntou para nós: – Que tal o hino? Aí, o Júlio avançou, né: – Ô Padrinho, mais o hino é bonito! Mas o hino é maravilhoso! Aí, o Padrinho respondeu: – O hino não é tão bonito assim como você está dizendo, não. Não é essa maravilha como você está dizendo, não. Sabe o que é bonito do hino? É fazer o que o hino diz. Isso sim, é bonito! Rapaz, eu fiquei… Puxa vida, me tirou duma! Porque eu ia responder a mesma coisa do Júlio! Não ia dizer diferente. Mas estava guardado era para o Júlio mesmo (risadas)” (Depoimento de Luiz Mendes a Florestan Neto, Capixaba, AC, 2001).

 

HINO 123 – EU ANDEI NA CASA SANTA

“Irineu Serra comentou com meu pai, Júlio Carioca, como recebeu o hino Eu Andei na Casa Santa, relatando como sua professora espiritual puxava sua orelha sempre que mostrava um de seus seguidores por caminhos tortuosos – “Esse é um dos teus, dos que tu dizes que segue a tua linha”, disciplinava a Rainha. ‘Ele nos apresentava à Virgem Mãe como seus filhos’, comentou Júlio Carioca” (Entrevista concedida a Jairo Carioca, disponível no livro Vovô Irineu, p. 288).

 

HINO 126 – FLOR DAS ÁGUAS

“Esse hino foi apresentado na Concentração e ele foi…Tinha um bocado de irmão ao redor dele, e ele perguntou o seguinte: – Onde fica o coração do mundo? Aí, um olhou para o outro. O outro olhou para outro… ninguém disse nada nessa hora. Não souberam, não. Aí, ele foi e disse: – O coração do mundo é o mar. Aí, eu ouvi bem pertinho ali, né. Eu esperava uma pessoa assim, já de idade responder para ele, mas também eu não sabia, não. Eu disse: – Eu vou esperar para ficar sabendo onde é! É o mar” (Depoimento de Nonato Mendes, irmão de Luiz Mendes, a Florestan Neto, Bujari, AC, 2001).

“Um dia Mestre Irineu surpreendeu a equipe da mata [busca do cipó e folha], que era liderada por seu Francisco Granjeiro, fazendo uma pergunta para ele, seu João Rodrigues Facundes e seu irmão Antônio Facundes: – Vocês ouvem cantar aí, Flor das Águas, mas para vocês quem é Flor das Águas? – Perguntou o Mestre, conta seu Júlio Carioca. Compadre Chico respondeu para ele que era o Daime, a mesma resposta que deu o compadre Nica e o compadre Cancão [os irmãos João e Antônio Facundes]. Ele deu o prazo de dez dias para eles retornarem com aquela resposta. Quando todos saíram, ele me chamou e disse: – Júlio, Flor das Águas é o oceano. Esse segredo Júlio é o conhecimento de todos que estão comigo, mas é se todos se conhecerem aqui dentro, mas ninguém presta atenção, prefere falar da vida uns dos outros. Mas eu conheço os meus e no meu trabalho não perco nenhum” (Depoimento de Júlio Carioca a Jairo da Silva Carioca, disponível na monografia de Jairo intitulada Doutrina do Santo Daime: A Filosofia do Século, 2000, p. 71-72).

 

“MARCHINHA”, HINO 127 (EU PEDI), HINO 128 (EU CHEGUEI NESTA CASA), HINO 129 (PISEI NA TERRA FRIA) – TRECHO DE UM DEPOIMENTO DE LUIZ MENDES DO NACIMENTO A FLORESTAN NETO, CAPIXABA, AC, 2001.

 

Luiz Mendes: – Ele recebeu esse hino (“Marchinha”) e esse hino tinha palavras, só que ele guardou para si e apresentou só a parte musical. Um dia eu chego lá e ele pediu e me perguntou se eu queria escutar uma música. Sempre que ele recebia um hino e eu chegava lá, ele anunciava para mim e perguntava se eu queria ouvir. Ora, quem não queria? Esse foi um. As meninas solfejaram, solfejaram, solfejaram… Quando terminou, ele disse: – É só isso aí. O pessoal que estava lá começou a sair, a se dispersar e, em dado momento, só estava eu e ele. Aí, ele virou para mim e disse: – Luiz, tem as palavras, tem as palavras, só que eu não tenho a condição de divulgar, porque não existe preparo; portanto, eu vou ficar com elas e deixe que seja só musicada. Eu me conformei e não insisti para que ele me dissesse a letra, não forcei. Mas ficou a vontade de saber. Rolou uma porção de anos. Quando foi um dia, eu estava no roçado sozinho, o Sol esquentou e fui procurar uma sombra e me sentei numa sombrinha, só ali sentado em cima de um pau, e aí, foi assim como uma pessoa conversando comigo: – Tu tens vontade de aprender as palavras que estão lá na música daquele hino? Eu respondi: – Tenho! Daí saiu as palavras do hino para mim. São duas estrofes apenas. É justamente, ele encaixando um pedido que ele fez [hino 127, Eu Pedi], porque a existência do Mestre chegou a um ponto de ficar com ele. Ele é quem resolveria e pediria para ir [desencarnar]. Primeiro, marcaram uns anos de existência para ele. Depois, isso foi desfeito, porque a Rainha prolongou até a passagem dos 75 anos, foi um prolongamento que a Rainha deu para ele. Ele até contava para nós como foi que entendeu. É que passava um cavalheiro por ele e gritava: – Setenta e cinco! Aí, esse cavalheiro ia embora e depois de mais um tempo aparecia de novo e gritava: – Setenta e cinco! O cavalheiro ia embora de novo e, assim, esse cavalheiro passou por ele diversas vezes gritando setenta e cinco! Daí o Mestre ficou cismado com aquilo, procurando entender o significado. Até que lá veio o cavalheiro novamente e quando ele passou e disse “setenta e cinco”, o Mestre entendeu o significado e completou: – Setenta e cinco anos de vida!

Florestan: – Isso foi em sonho ou miração?

Luiz Mendes: – Em miração ou que fosse em sonho, porque o Mestre identificava uma coisa com a outra. Ele dizia: – Para quem toma Daime, sonho é o mesmo que miração. Aliás, existem travessias que a gente passa em sonhos, que a gente mirando não suportaria. Vem o sonho e dá mais uma estabilidade. Bom, voltando ao assunto anterior, aos setenta e cinco anos ele desencarnou, ele foi embora sem que ninguém percebesse, desencarnou mesmo, foi embora. Aí, a Rainha foi e disse para ele lá na morada eterna: – Filho, agora tu vais voltar, porque vem sendo tão útil… Eu vou fazer um negócio com você: – Doravante a existência tua lá na Terra é você quem vai marcar. No dia que tu quiseres me pede, e aí é a hora, mas está em tuas mãos. Quando eu ouvi ele contar isso pela primeira vez, a sala estava cheia de gente e aí eu fiz uma pergunta: – Padrinho, mas vai demorar muito o senhor fazer esse pedido, não vai? Ele olhou para mim e disse: – Luiz, aqui me aparece tanta coisa desagradável, tanta coisa que eu não gosto, que me dá vontade de ir é logo. Sabe o que aconteceu? Foi isso que aconteceu, o hino [musicado] identifica, né? Porque as palavras dizem assim:

 

Ô mamama, mamamãe

Ô mamama, mamama, mamamãe

Ô mamama, mamamãe

Ô mamama, mamamãe

 

Minha mãezinha querida

Dos meus irmão vou me despedir

Saudosamente me despeço

E a minha mãe eu vou pedir

 

Luiz Mendes: – O que foi que aconteceu? “Eu pedi, eu pedi, eu pedi/Eu pedi, mamãe me deu/Para mim me apresentar/Ao divino senhor Deus”. Aí, ele justamente pediu. A partir desse pedido, demorou bem pouco. Ele viajou de novo, foi embora.

Florestan:  – Esclarecendo: ele primeiro fez uma passagem aos 75 anos e voltou?

Luiz Mendes: – Ele já tinha feito uma outra antes dessa, dos 75 anos. Essa foi a segunda. A primeira eu não sei precisar com quantos anos, mas aí foi prorrogado até os 75. Aí, a terceira vez já foi justamente antes do penúltimo hino [128, Eu Cheguei Nesta Casa], quando ele foi pensando em não voltar – não é o que o hino diz? Mas ele voltou mais uma vez para justamente agradecer: “Eu venho dar os agradecimentos a quem rogou por minha volta”, e ao mesmo tempo nos passar uma lição imensa, muito valorosa, que é pedir e saber pedir porque são válidos os nossos pedidos, naquilo que justamente está dentro do regulamento. Pedir, saber a quem se pede e saber também o que se pede, né? Bom, o certo é que os pedidos foram tantos… que mandaram ele voltar. E aí ele voltou, voltou agradecendo e dando testemunho dos pedidos: “Me mandaram eu voltar/Eu estou firme, vou trabalhar/Ensinar os meus irmãos/Aqueles que me escutar”. Depois disso, a gente pensava em uma estabilidade maior, só que, a partir daí, ele viveu… deixa eu ver… se foi mais de um ano, foi pouca coisa. Não sei bem, mas foi pouco tempo. Aí, lá vem Pisei Na Terra Fria para justamente concretizar. Aí, nem os pedidos deram mais jeito. Ele se expôs, de acordo com o conteúdo do hino. Aí eu vou falar uma coisa: ele estava bem no centro da mesa e à altura da gente compreender, né. Justamente, abalou. Eu me lembro que ainda houve choro. Tinha gente que chorava até alarmando, principalmente o lado das mulheres. Só que, quando ele sentia que o clima estava abalado, ele controlava dizendo assim: – Deixem de besteira, isso vai demorar ainda. Vocês se preocupam tanto comigo. É bom que cada um se preocupe consigo. Isso aí é o caminho de todos. Ele dava aquele banho-maria, mas até que não teve mais jeito. A gente fica assim… é um caso para se estudar. De um lado leva-se a acreditar que, realmente, até os dias dele estavam contados. Mas assim, pelo que eu penso, pelo que eu vejo, existem revogações. Pode ser revogado, Deus é grande. Pode chegar o seu dia realmente marcado, mas quem sabe por uma utilidade, uma necessidade, um jeito de ser tão útil, Deus não revoga? Porque para o Mestre foi revogado em duas oportunidades! A terceira foi a que ficou com ele. Então, a gente fica nessa. Será que a última passagem dele não poderia ter sido revogada se a gente tivesse zelado melhor? Porque isso se lamenta, mas se lamenta mesmo. Olha, o povo teve seus aproveitamentos, mas deveria ter aproveitado melhor.

NOTA: quanto à letra do hino Marchinha recebida por Luiz Mendes do Nascimento, em nenhum momento, aquele que foi escolhido por seu guru para ser seu Orador (ou seja, porta-voz), desejou ou fez menção de incorporá-la oficialmente ao hinário O Cruzeiro, nem mesmo na entidade que fundou junto à sua família. Em meus dez anos (2000-10) de ligação institucional com o CEFLI (Centro Eclético Flor do Lotus Iluminado), raríssimas vezes ouvi a Marchinha ser apresentada com letra.

 

HINO 128 – EU CHEGUEI NESTA CASA

“Já em 1970, após ficar durante três dias em coma profundo agonizando em cima de sua cama, com alto grau de febre – ele recebeu um hino avisando – relata seu Wilson Carneiro. “A gente ficava em equipes se revezando para rezar e dar assistência para ele voltar”, lembra dona Lourdes Carioca. Foi quando  Mestre Irineu recebeu o hino [Eu Cheguei Nesta Casa]… Era seu penúltimo hino. A irmandade o recebia de volta e restabelecido, porém, sabiam que sua passagem estava próxima. Foi quando Mestre Irineu começou organizar a Doutrina para sua ausência. Deixou de ir às sessões de Concentração e aos hinários oficiais, ordenando que presidisse esses trabalhos, o senhor Leôncio Gomes da Silva. (…) Outras providências iam sendo tomadas pelo Mestre, que disse muitas vezes para todo o grupo: “Vou sair daqui e deixar uma doutrina pronta, sem precisar colocar nem o pingo no i”, lembra seu Júlio Carioca” (Jairo Carioca em Doutrina do Santo Daime: A Filosofia do Século, Rio Branco, AC, 2000, p. 72-73).

 

HINO 129 – PISEI NA TERRA FRIA

“O hino da terra fria, quando cantou a primeira vez, foi numa Concentração. Após, foi um chororó dentro da sede. (…) Foi a Maria Zacarias que puxou o hino. Ele ultimamente recebia e entregava para uma pessoa cantar. Aí, a Maria puxou o hino. Ele se levantou e disse: – Hei! Vocês estão pensando que eu vou morrer, é? Não, não vou morrer agora não, vou morrer mais um dia…”. Mas já estava bem pertinho” (Depoimento de Nonato Mendes a Florestan Neto, Bujari, AC, 2001).

“No final de 1970, após seu aniversário [15 de dezembro], pelos dias 17 ou 18, ele recebeu o hino Pisei na Terra Fria. Esse hino era recém-recebido quando um dia eu estava lá e ia inclusive cortar o cabelo dele, porque eu era quem cortava o cabelo dele. O barbeiro dele era eu. Tinha uma pessoa dentro da casa dele, em um determinado cômodo, cantando “Pisei na terra fria…”. Estava lá cantando naturalmente. Aí, o Mestre falou: – Ô Maria, esse hino não é diversão, esse hino é de condolência para quem tem coração. Ele ainda falou que, futuramente, queria colocá-lo só na Missa e para ser cantado no Dia de Reis, na entrega dos trabalhos, mas não para ser bailado. Quando for cantar ele, fica todo mundo perfilado, sem maracá e sem baile. Aí, depois dele canta-se o hino Oferecimento. Aí, pode bailar e encerrar” (Depoimento de Percília Matos, zeladora d’O Cruzeiro, a Florestan Neto, Rio Branco, AC, 2001).

 

COMENTÁRIO GERAL SOBRE OS HINOS NOVOS

 

“Dentro desses últimos hinos dele, os Hinos Novos, que começa no hino Dou Viva A Deus Nas Alturas e termina no hino Pisei na Terra Fria, é ele palestrando, é uma palestra dele. É ele fazendo uma explanação como se fosse uma preleção de final de trabalho. Um irmão uma vez falou assim: – Padrinho, por que o senhor quando termina um trabalho não faz umas palestras, assim como o crente faz, o pastor faz? Ele disse assim: – Nós aqui não trabalhamos com a Bíblia, nós aqui trabalhamos com a consciência. Eu acredito na Bíblia, mas não trabalho com a Bíblia na mão; a minha Bíblia é o Daime e os hinos. Ele ainda falou: – Esses Hinos Novos são o meu recado que estou deixando aí. Isso aí é a minha palestra. Você veja que os Hinos Novos são um resumo dos ensinamentos do Mestre” (Depoimento de Pedro Domingos da Silva, companheiro de Percília Matos, a Florestan Neto, Rio Branco, AC, 2001).

“(…) Quando eu trazia o Daime do Mestre, cheguei em Rio Branco na casa do Wilson [Carneiro]. Ele me disse: – Meu irmão, você só vem aqui com pressa, eu estive lá na casa do Mestre e ele me disse: – Eu tenho muito que falar com seu Virgílio. Como que diz: – Ele só vem aqui avexado! Eu disse: – O que será? Cheguei lá no Mestre e ele pergunta: – Veio buscar Daime, seu Virgílio? Eu disse: – Foi Mestre. Ele disse: – Quando o senhor quer ir? Eu lhe respondi: – O senhor é quem manda o dia que o senhor quiser que eu vá. À noite tomamos Daime. Ele mandou a esposa dele [Madrinha Peregrina] armar uma bonita rede para mim, e eu queria ficar ao lado dele. Mas ele disse: – Vá deitar, seu Virgílio. Eu fui logo deitar. (…) As mulheres começaram a tocar no violão os dez últimos hinos d’O Cruzeiro. Começaram tudo bem. Quando chegou no hino Eu Tomo Esta Bebida, que dizia “subi com alegria”, parecia que o violão parava. Mas não era isso, era porque faltava alegria. Só se sobe se tiver alegria, se tiver amor – “conforme os meus ensinos”. Se você ensinou só o bem, você sobe. Se você ensinou o mal, você não sobe nunca. Terminou o trabalho, o Mestre foi lá onde eu estava e me perguntou: – Mirou? Eu lhe disse: – Não senhor. Comecei a mirar, mas parecia que eu tinha coisa errada e nisso perdi a miração. Ele deu uma risada e disse: – Não tinha nada errado não, seu Virgílio. Aí, fomos conversar. Ele me explicando algumas coisas e no dia seguinte amanhece, tomamos café, conversamos um pouco, aí eu disse: – Mestre vou à cidade, tenho parentes e nunca vou lá visitar eles. Fui. Logo que passou da sede [local das sessões] senti o efeito como se tivesse tomado Daime. Parei e contemplei. No momento comecei a receber as explicações dos treze derradeiros hinos d’O Cruzeiro, que tinha até o momento. Naquele dia, o Mestre não disse que tinha muito que conversar comigo? Pois bem, do Alto Santo até a cidade dava oito quilômetros e duas horas de caminhada devagar. Logo que comecei a andar, fui recebendo os ensinamentos na sequência, como eles são colocados em cada número, do 117 ao 129. Vou começar a explicar:

01 – Dou Viva A Deus Nas Alturas (117) – Indica que devemos considerar a Deus em primeiro lugar;

02 – Todos Querem Ser Irmãos (118) – Em segundo lugar, indica que devemos considerar o nosso irmão. Depois de tudo é que podemos confiar;

03 – Confia (119) – Confia no poder e se unir com os seus irmãos para poder pedir. Pedindo vem a força;

04 – Eu Peço (120) – Pedi ao Pai divino para vir a força;

05 – Esta Força (121) – A força veio para você trabalhar;

06 – Quem Procurar Esta Casa (122) – Encontrei com o Daime. Encontrei com a Virgem Maria e ela, como mãe de bondade dá a nossa saúde;

07 – Eu Andei Na Casa Santa (123) – Antes de chegar nesta casa você estava à toa. Você estava à toa quando se encontrou com esta santa bebida. Aí vem ele, o Daime;

08 – Eu Tomo Esta Bebida (124) – Quando você estava à toa, tomou o Daime. Concentre e escute os hinos que são as lições para os ensinos desta aprendizagem, desta escola divina;

09 – Aqui Estou Dizendo (125) – Significa que os hinos é a voz de Deus nos ensinando e explicando tudo, para nós aprender a ser gente, par poder ser um filho de Deus. Aí é que está o segredo de todos se conhecerem aqui dentro da verdade;

10 – Flor Das Águas (126) – É o Daime, é o próprio Deus. Se até o número 9 (125) você compreender e aprender essas nove lições, aí vem a décima, você já está com Deus no coração. Já está preparado para pedir a Virgem Maria para se apresentar ao senhor Deus;

11 – Eu Pedi (127) – Você está pedindo para se apresentar ao Divino. Os hinos daí para a frente não são mais lições, são perfeição de sabedoria; são um certificado do seu diploma do curso espiritual;

12 – Eu Cheguei Nesta Casa (128) – É o 12, explicando que éramos aqueles que estávamos à toa e viemos dar os agradecimentos ao Mestre e a Rainha que rogavam por nossa volta para dentro da luz. A luz da sabedoria, da compreensão, do entendimento. Essa luz clareia todas as nossas prendas da vida, o astral que é o espiritual;

13 – Pisei Na Terra Fria (129) – Representa a nossa passagem para a vida espiritual. (Depoimento de Mestre Virgílio à antropóloga Arneide Bandeira Cemim em Porto Velho, Rondônia, disponível em sua tese de doutorado Ordem, Xamanismo e Dádiva: O Poder do Santo Daime, Vol. 1. USP, 1998, p. 173-179).

 

HINOS DA MISSA QUE NÃO FORAM RECEBIDOS POR MESTRE IRINEU: HINO 01, SENHOR AMADO; HINO 07, SENHORA MÃE SANTÍSSIMA; HINO 08, OH! MEU PAI ETERNO; HINO 09, DESPEDIDA – COMENTADOS POR PERCÍLIA MATOS EM ENTREVISTA A FLORESTAN NETO, RIO BRANCO, AC, 28/01/2001.

 

Florestan: – Eu gostaria que a senhora explicasse o hino 07 da Missa, Senhora Mãe Santíssima, pois sabemos que pertence ao hinário de Germano Guilherme. Então, como é a história desse hino? Não foi Germano que ofereceu, foi o Mestre que escolheu?

Percília: – Os hinos da Missa… ele fez essa escolha dos hinos que haviam de ficar eternamente na Missa. O próprio Mestre que fez a escolha dos hinos que são permanentes da Missa.

Florestan: – Ele que pegou do Germano?

Percília: – Sim. Tem do João Pereira!

Florestan: – Qual?

Percília: – Aquele que na hora da Missa faz uma cruz de vela acessa.

Florestan: – Deixa me lembrar qual é…Esse hino é logo em seguida ao hino do Germano. Oh! Meu Pai Eterno! Esse hino é do João Pereira?

Percília: É. Canta-se fazendo uma cruz. Foi recebido por ele, mas tudo é da mesma linha (risada). É do mesmo dono.

Florestan: – A senhora tem algum comentário a fazer sobre o hino Despedida?

Percília: O Despedida foi do irmão Joaquim… Chamava-se Joaquim “Português”. Agora, eu não sei o nome dele. Ele era português mesmo. Ele tinha um hinário pequenino, do qual um desse o Mestre escolheu para a Missa, esse, Despedida.

Florestan: – Joaquim “Português”?

Percília: – É, Joaquim “Português”. Ele morreu no Rio de Janeiro.

Florestan: – Certo. Agora vejamos: Dois de Novembro, do Mestre; Rogativo Dos Mortos, do Mestre; Mãe Celestial, do Mestre; Equiôr, do Mestre; Todo Mundo Quer Ser Filho, do Mestre; e… Senhor Amado também é do Mestre?

NOTA: como vimos acima, o hino Dois de Novembro foi cantado para o Mestre em um trabalho, pelo espírito desencarnado de dona Francisca, sua segunda companheira.

Percília: – É do seu Germano, também. É do hinário do seu Germano, mas é só da Missa.

Florestan: – Então, na verdade, dos dez hinos que compõem a Missa, Germano tem dois, Senhor Amado e Senhora Mãe Santíssima, João Pereia tem um, Oh! Meu Pai Eterno, e o seu Joaquim “Português” tem um, Despedida. Confere?

Percília: – Confere. É isso mesmo.

Florestan: – Muito bem, obrigado!

 

AS DIVERSÕES DE MESTRE IRINEU

 

01 – PÁ PILAR

“(…) O hino é Pá Pilar. Ele cantava pá pilar. Ele recebeu na Vila Ivonete (…) O que quer dizer “pá pilar” eu não sei, nunca perguntei a ele não, mas uma vez perguntaram para ele. Aí, ele só fez cantar. Ele não falou nada, só cantou. Canta três vezes” (Percília Matos, Rio Branco, Ac, 2001).

“Ele contando a história, isso numa miração que ele chegando em determinada paragem, apareceu na frente dele uns tocos de madeira, mas tudo assim… feito zigue-zague. Então, ele teria que atravessar aquilo ali com um pilãozinho… sem perder o passo. Não podia perder o passo. Aí, cantaram o hino para ele. De acordo com o hino, ele ia fazendo o trajeto. O pra pilar era ele pilando. Se é pra pilar, eu vou pulando. Pulando e pilando” (Luiz Mendes do Nascimento, Rio Branco, 2001).

 

02 – CACHEADO

“O Cacheado é uma entidade que se apresentou para ele; e nos hinos dele, os índios e os caboclos da mata tem muita influência. O Mestre estava trabalhando dentro da miração quando apareceu para ele duas entidades. Um conversando com o outro: – Cacheado! Venha Cá! Aí, o outro respondeu sorrindo, né: – Carracacarracacá. Aí, quando o primeiro quis chamar de novo, o segundo respondeu rindo mesmo: – Carracacarracacá!!! Aí, ele dobrou a risada, que justamente é “carracacarracacá”, uma risada dobrada. E o Mestre vendo aquilo, quando veio a música…” (Percília Matos, Rio Branco, AC, 2001).

 

03 – CANTAR ME APARECEU

“Ele disse que a entidade apareceu para ele, conversou com ele e foi embora. Ele não perguntou quem era. A entidade não disse o nome, porque ele não perguntou. Aí, ele diz que eles tornaram a se encontrar de novo, e ele não perguntou quem era novamente” (Percília Matos, Rio Branco, AC, 2001).

 

04 – DEVO ACOCHAR O NÓ

“Essa é uma diversão e ao mesmo tempo serve… Por exemplo: um casal não está se entendo bem, está desigual. Cante esse hino três vezes. Mas meu Deus, é uma benção! O hino pede união, “Devo acochar o nó de quem quer se desatar… Essa instrução de cantar três vezes, foi ele quem deu. É para acalmar o casal, acalmar as desarmonias” (Percília Matos, Rio Branco, AC, 2001).

 

05 – AURORA DA VIDA OU LAMENTO

“Esse hino era a Francisca das Neves. Era a primeira mulher do meu pai, José das Neves. Ela tinha muito ciúme do meu pai, era aquela confusão medonha. Quando foi um dia, parece que ela o encontrou conversando com outra mulher. Aí, foi atrás de se vingar. Foi embora para Brasiléia. Lá, ela recebeu esse hino. Aí, ela veio aqui e cantou para o Mestre. Aí, ele colocou nas diversões. Esse hino, ele vem numa música de uma valsa antiga que tem, entendeu? Não é praticamente, assim, como você recebe um hino dentro do Daime. Ele foi recebido assim… dentro de um sonho. O que eu sei desse hino, eu vi o velho contando. Esse hino, dentro dele, já vem a história, o sofrimento que ela passou por ter feito o que fez” (Depoimento de Paulo Serra, filho adotivo de Mestre Irineu, a Florestan Neto. Bairro Irineu Serra, Rio Branco, Ac, 2001).

NOTA: o prezado condiscípulo Paulo Moreira, que também esteve com Paulo Serra em sua minuciosa pesquisa biográfica transformada em livro, esclarece alguns pontos importantes da versão: “De fato, parte da melodia e parte da letra da diversão 05 – Aurora da Vida são semelhantes à valsa serenata “Ave Maria” de Euclides de Campos, composta em 1924 [Aurora da Vida foi recebida em 1936 na Vila Ivonete]. Na comunidade do Daime comenta-se que essa “diversão” foi recebida de forma diferente das outras diversões e hinos, pois, quem na verdade teria trazido a canção foi o “espírito” de Francisca das Neves (ex-mulher de José das Neves) repassando-a ao Mestre em sonho” (Livro Eu Venho de Longe: Mestre Irineu e Seus Companheiros. Salvador: EDUFBA, 2011, p. 172. Colchetes meus).

 

ENCERRAM-SE AQUI AS NARRAÇÕES – ATUALIZADAS COM OUTRAS OBRAS – DAS HISTÓRIAS DOS HINOS PUBLICADAS PRIMORDIALMENTE NO LIVRINHO CONTOS DA LUA BRANCA. RIO BRANCO: FUNDAÇÃO ELIAS MANSOUR, 2003.

 

Homenagem (fotos) aos queridos e saudosos mentores Percília Matos da Silva (08/07/1926 – 27/10/2004), Zeladora d’O Cruzeiro, e Luiz Mendes do Nascimento (04/01/1940 – 29/06/2019), Orador de Mestre Irineu.

 

 

Respostas de 8

    1. I understand your need. I’m sure that in time the texts will be available in English. Thanks for your participation!

  1. Nosso mestre sofreu por demais, para deixar o mais lindo e sublime conhecimento para nós salvar do mar de lágrimas. Agradeço o empenho por descrever o dia a dia dia trabalhares dia reino juramidam. Elevo meu maior respeito a Santa doutrina. Salve mestre Irineu.

  2. Grande fonte de auto conhecimento

    Muita gratidão já consagro Santo Daime a 6 anos e nada sabia dessa linda história que nós istrui desde o início da Doutrina até os dias de hoje gratidão tô estudando

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *